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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O PIOR CEGO


O PIOR CEGO
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Ainda guri, já ouvia o velho ditado: “o pior cego é aquele que não quer enxergar”. Lá se vão mais de quarenta anos, porém reforço a convicção de que o dito popular segue valendo. Talvez, mais do que nunca. Por vezes, fica a sensação de que vivemos numa terra de “cegos”. Tem sido muito comum nos depararmos com pais tomados de uma cegueira senão total, quase que completa. Apesar do discurso recheado de uma aparente autoridade e ascendência sobre o filho, este último reina absoluto dentro de casa. É ele quem, de fato, dita as regras. Sua palavra soa como verdade, em que pese todos os indícios a denunciarem exatamente o contrário. As vontades e manias do guri – por vezes, quase um homem – prevalecem, sob o risco de a família entrar em “conflito”. Triste e perigoso engodo. A demora de tais pais em detectarem e enfrentarem a falta de limites do rebento, muito provavelmente redundará, isto sim, numa tragédia familiar. Prato cheio para a delinquência, uso e/ou tráfico de drogas, mentiras reiteradas, irresponsabilidade, falta de compromisso, preguiça doentia, entre tantos outros dissabores. A escola, por certo, paga caro pela omissão e condescendência dos pais “cegos”. Contudo, o maior preço a ser pago é pela própria família. Caberá a esta, afinal, conviver por muitos anos, décadas e mais décadas, com os “pesadelos” por ela mesma criados e alimentados. Pesadelos que fazem chorar e sofrer. Pesadelos que levam à morte física, mental e espiritual. Pesadelos que, quase sempre, extrapolam os limites da própria casa, respingando em muitas outras famílias, com ou sem grau de parentesco. Pesadelos que aniquilam com a ideia de “lar”, pois que a tranquilidade, o diálogo, o carinho, a estabilidade, a paz, a felicidade duradoura e, acreditem, até mesmo a esperança, cedem lugar à desconfiança, à mentira, ao pranto, à enfermidade do corpo e da alma, ao medo, à violência... Pesadelos que comprometem e, não raras vezes, põem a perder as relações, mesmo aquelas mais profundas. É triste e preocupante observar, por exemplo, pais desautorizando decisões das instituições de ensino, mesmo que flagrantemente justas e juridicamente perfeitas. É vergonhosa a postura irresponsável de pais que se tornam reféns dos caprichos e baldas de crianças e adolescentes. Não sabem, ao que parece, os pais “cegos”, que ao serem omissos e coniventes frente à falta de respeito do filho pela hierarquia personificada na pessoa do professor, nada mais fazem do que abrirem mão da própria autoridade. Pais que pensam, agem e, não raras vezes, vestem como crianças e adolescentes. Tamanha aberração tem gerado imensuráveis prejuízos à teia social. Filhos e filhas paridos sem a existência dos modelos e referências indispensáveis. Naus sem bússola. A inexistência de um “norte” claro, firme e convincente tem engendrado seres vazios do ponto de vista ético e moral. Pais “cegos” temem em dizer não, mesmo quando necessário. Pais “cegos” criam uma redoma em torno do filho, onde, parecem acreditar, não há lugar para a dor e frustração. Formam o guri para o “mundo”, não o que desejamos, mas um mundo “paralelo”, onde o hedonismo, o materialismo exacerbado, o individualismo e a torpeza prosperam. Ironicamente, o mesmo mundo que eles, os pais “cegos”, paradoxalmente condenam em seus discursos bem elaborados. Cabe à escola, também, tensionar para que o olhar míope ou até mesmo tomado pela catarata retome a acuidade visual. Para isso, mister que haja coragem, disposição e convicção por parte das instituições de ensino. Tamanha e complexa “operação cirúrgica” requer paciência, resiliência, ética, competência, estudo, planejamento, coerência, capacidade para ouvir e auscultar inclusive o “não-dito”. Requer, sobretudo, amor.  

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