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segunda-feira, 1 de outubro de 2012

FAÇAMOS NÓS?



FAÇAMOS NÓS?
Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Onde está o Estado? Este foi concebido e aceito, ao menos pela maioria, como sendo a personificação de um pretenso “interesse coletivo”. Hobbes, no século XVII, já defendia a necessidade de um Estado capaz de frear a forte tendência do homem em buscar seus próprios interesses, mesmo que em detrimento do interesse da maioria. A partir da premissa de que o homem seria “lobo” do próprio homem, é que surgiu a mais famosa teoria do Estado, a do chamado “contrato social”, teoria esta – direta ou indiretamente, aberta ou sorrateiramente – ainda presente. No Brasil, é sabido, tivemos o surgimento de um Estado (aqui entendido como o ente público em todas suas esferas e manifestações) inicialmente associado a interesses de fora. Durante o período de colonização, em regra, as decisões tomadas nestas bandas vinham, num primeiro momento, ao encontro dos interesses da Coroa. A maioria da população brasileira – formada por negros, índios e mestiços, tendo em comum o fato de serem pobres – estava à margem de qualquer benesse oriundo do Estado português. A chamada “independência” (1822) pouco acrescentou à qualidade de vida da maioria. Esta seguiu alijada das condições mínimas de saúde, moradia, alimentação, renda ou educação, por exemplo. Poucos foram os reais beneficiados com a instalação do Império. Enquanto os grandes latifundiários e poderosos comerciantes aumentavam seu poderio econômico e político, a distribuição de renda seguia injusta e concentrada nas mãos de uma pequena oligarquia. O tempo passou e com ele veio a República (1889). Apesar das ideias aparentemente revolucionárias – oriundas, quase sempre, de uma burguesia europeia –, o Brasil permaneceu sendo a terra dos coronéis, cujas decisões políticas apenas corroboravam o já sedimentado poder econômico. A dita República Velha com seu maniqueísmo forjado na política do “café-com-leite”, a Era Vargas com seu populismo assentado num discurso flagrantemente paradoxal, a Ditadura Militar com seus excessos – injustificáveis, mesmo que diante de uma “esquerda” por vezes equivocada –, a Nova República com a subida ao poder das mesmas “figurinhas” do passado, o Brasil de hoje com sua letargia e paralisia a fazer prosperar o sentimento de indignação frente à omissão, impunidade, injustiça e exclusão. O que todas as fases de nossa história têm em comum? A incapacidade do Estado brasileiro em atender as reais demandas da maioria. Reforça-se o sentimento de que o Estado brasileiro é dispensável. Por que um Executivo mastodôntico? Um Executivo tomado de assalto por CCs, imprestáveis sob o ponto de vista do interesse público, só vistos quando a tremularem bandeirolas nos períodos de campanha eleitoral? Um Executivo que recomeça do zero a cada “nova” gestão, feito cachorro em torno de seu próprio rabo? Um Executivo partidarizado, pertencente a uma legenda? Um Executivo estrábico, sem olhar “certo”, confuso? Um Executivo sem noção do que seja política de Estado? Um Executivo que só trabalha movido pela proximidade do pleito ou quando pressionado pela mídia?

                Por que um Legislativo que legisla em causa própria? Um Legislativo apadrinhado a interesses espúrios? Um Legislativo formado, não raras vezes, por figuras que construíram suas candidaturas sobre frases de efeito, poder econômico ou caricaturas de palhaços? Um Legislativo que, na contramão da realidade de quem o paga, trabalha pouco e folga um eito? Um Legislativo inchado e recheado de privilégios? Um Legislativo que discursa para si e para as moscas? Um Legislativo que pouco ou nada produz, sequer textos legais que venham ao encontro dos interesses da coletividade? Um Legislativo que olha narcisicamente para si mesmo? Um Legislativo que se prostitui em meio à distribuição de parcos ou volumosos recursos públicos? Um Legislativo que se afunda em meio a uma sopa de letrinhas e legendas, numa verdadeira dança das cadeiras, incompreensível aos pobres mortais (nós contribuintes!)? Um Legislativo incapaz de ouvir os reclames da maioria, salvo quando potencializados pelos holofotes da TV os gritos dos mais humildes? Um Legislativo corporativista, verdadeiro campinho de históricos coronéis e caudilhos?

                Por que um Judiciário lerdo e moroso? Um Judiciário caro, de difícil acesso e quase impossível atendimento à demanda justa, especialmente se nascida em meio a mocambos e palafitas? Por que um Judiciário mais preocupado com frases em latim do que com a voz que nasce em meio aos mais pobres e necessitados? Por que um Judiciário movido por onerosos recursos e agravos, bancados em regra por quem pode pagá-los? Por que um Judiciário excessivamente formal e pedante, distante dos que sequer tiveram acesso às primeiras letras? Por que um Judiciário que solta o bandido e prende o trabalhador? Por que um Judiciário que corrobora a impressão de que o mundo é dos “espertos”? Por que um Judiciário que concede liberdade a homicidas, estupradores, sequestradores, assaltantes, tudo em nome ou de um bem pago habeas-corpus ou de um “garantismo” doentio e irresponsável? Por que um Judiciário que ao postergar suas decisões causa imensuráveis danos à sociedade? Por que um Judiciário atolado em processos que nascem da profunda insegurança jurídica que grassa por este país afora? Por que um Judiciário que não denota respeito e temor?

                Resta, portanto, a pergunta: por que Estado? Para quê? Para quem? Historicamente, no Brasil, o Estado tem sido um Saara de inépcia, lentidão, frouxidão, corrupção e incompetência. Fracassado e caro, muito caro! Um Estado que expropria o trabalhador através de uma política fiscal e tributária insana, irresponsável, injusta e desumana. Tudo, sob o olhar complacente e condescendente dos chamados “Poderes” constituídos. Nada mais natural e aceitável, portanto, do que perguntar: façamos nós o que o Estado não tem feito?

                Façamos nós? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam os criminosos, delinquentes e meliantes prosperando em seus intentos? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam os sequestradores, estupradores e violentadores levando nossos filhos e mulheres? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam os ébrios e adeptos de rachas ceifando a vida de nossos entes queridos no trânsito? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam os narcotraficantes transformando em zumbis imprestáveis nossos jovens? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam alguns se apropriando indevidamente dos recursos públicos? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam alguns fraudando licitações? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam algumas empresas fraudando o consumidor, lesando-o em seu bolso e sua saúde? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam alguns destruindo o meio ambiente em nome do lucro desmedido? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam as intermináveis filas nos hospitais e postos de saúde? Façamos justiça com as próprias mãos ou sigam os desvios e malversação do dinheiro público, o mesmo que dizem faltar para a cultura e educação? Façamos justiça com as próprias mãos ou siga o deboche por parte da maioria dos partidos políticos em relação ao eleitor? Façamos justiça com as próprias mãos ou siga o descaso com a infraestrutura, estradas e saneamento básico? Façamos nós justiça com as próprias mãos?

                Apesar de aparentemente oportuna, fazer justiça com as próprias mãos parece não ser a melhor saída! Esta reside, isto sim, na refundação do Estado. Um Estado distinto daquele que era e continua sendo. O que se deseja é um Estado que seja, de fato, de Direito e democrático. Um Estado pautado, sobretudo, na justiça social, na equidade e no respeito à soberania popular. Um Estado que respeite e privilegie a sociedade civil organizada, um Estado que valorize a educação, a cultura, o lazer, a saúde e o esporte. Um Estado capaz de distribuir renda de forma efetiva, através da geração de trabalho, e não através de programas político-eleitoreiros. Um Estado que se mostre completa e absolutamente avesso à corrupção e ao crime de qualquer espécie. Um Estado que seja admirado, respeitado e temido por sua eficácia. Um Estado comprometido com os anseios dos mais humildes. Um Estado preocupado com as minorias, com as crianças e idosos. Um Estado fundado na democracia, na participação popular e na valorização e proteção da vida em toda sua complexidade. 

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