PRESENTE!
Gilvan
e-mail: profpreto@gmail.com
blog:
profgilvanteixeira.blogspot.com.br
Sempre ouvi dizer que o melhor amigo do homem é o
cão. Tenho lá minhas dúvidas. Sempre presente, nos acompanha desde que
nascemos. É duvidar, já se manifestava quando ainda estávamos no ventre e
éramos não muito mais do que um embrião. Presente desde o raiar até o ocaso do
sol. Manifestando-se na calada da madrugada, faça frio ou não. Sob os lençóis
da mais fina seda ou coberto por acolchoados feitos de remendos, lá está ele,
sempre presente. No banheiro, na cozinha, na sala, na varanda, enfim, em
qualquer lugar. Mostra-se inseparável. Às vezes, discreto, outras nem tanto.
Vez por outra, dá o ar – literalmente... – da graça nos locais mais impróprios.
Na hora e local erradas. Para nós, é claro! Ele, ao contrário, é todinho
indiferença. Todo lugar é lugar e toda hora é hora. Pouco liga para o que
pensamos ou pensam sobre nós. Quer, isto sim, é espraiar-se. Azedo, doce ou agridoce,
o fato é que sempre vem ao encontro de todos os gostos. Revela, ao menos em
parte, o que somos. É a nossa “cara”. Traduz um tanto de nossa personalidade.
Talvez, por isso, alguns preferem escondê-lo. Tentativa nem sempre recheada de
sucesso... Aí sim a emenda fica pior do que o soneto. É, por vezes, aí que
mostra toda sua força, verdadeiro turbilhão de sons e cheiros. Não adianta, lutar
contra ele é tarefa por demais ingrata. Melhor é não resistir. Na pior das
hipóteses, tentar negociar. Tipo assim... “liberdade com responsabilidade”.
Soltá-lo aos poucos, a conta-gotas, sob a condição de não se tornar público. Até
porque, jamais fica famoso. No máximo, “conhecido”. Daí os apelidos e alcunhas
que alguns lhe atribuem: silencioso, zangado, preguiçoso e tantos outros. Podem
acusá-lo de tudo, todavia não se pode negar sua originalidade. Pesquisassem,
certamente identificariam nele uma espécie de DNA. Único, revelador dos traços
de quem lhe tem. Diga-se de passagem, um relacionamento um tanto que
avassalador, por vezes. Senhor e servo são, nessa relação, papéis que se
confundem. Feito casamento. Quando menos se espera, lá se vai o antigo companheiro.
Sem carta, aceno ou sequer uma olhadela para trás. Ele sai da “vida” (corpo)
para entrar na história. Não incomum é, quando da despedida, nos deixar em maus
lençóis. Escancara para meio mundo o fim da relação. Ficamos com cara de
coitados. Não bastasse, ele ainda deixa marcas. Não eternas, é verdade, mas
profundas o suficiente para demandar duas ou três de mãos, além de muito sabão
em pó. Por outro lado, há de se dizer que ele instiga a discórdia, mas também a
cumplicidade conjugal. Passada meia-dúzia de anos, ele corre solto entre o
casal. Todo pudor fica de lado. A vergonha de outrora dá lugar a verdadeira
explosão de flatulências das mais diversas. Multicoloridas, com ou sem
“cheirinho”, etecetera e tal. O que antes era feito às escondidas, com o passar
do tempo, assume tamanha naturalidade que a simples falta dele passa a ser
visto com desconfiança. “Não me quer mais!”. O que é o anel preso ao dedo perto
da aliança gerada por entre os odores que só o amor, a partilha e a confiança
são capazes de produzir? Ele passa a ser visto como sinal de intimidade
doméstica. Feito segredo de cofre ou senha bancária, é algo a ser dividido
apenas e tão-somente entre os cônjuges. No máximo, também entre os filhos. Fora
de casa, nem pensar. Vira escândalo. “Quem foi?”. Como sempre, ninguém se
acusa. Todos desconfiam do cunhado, aquele mais gordinho, espremido no canto da
sala. Ah, aquela cara séria a ninguém engana. É, de certo, só uma coisa: todos
têm uma história de PUM para contar.
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