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terça-feira, 30 de julho de 2013

O HOMEM QUE NINGUÉM VIA


O HOMEM QUE NINGUÉM VIA
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                Passeava pelo pátio da escola. Alguns minutos do recreio já tinham se ido. A gurizada formava grupos aqui e acolá. Alguns mais numerosos, outros não mais do que duplas. Por mais que insistisse – Bom dia! Bom dia! Tudo bem? Tudo bem? – ninguém respondia. Só silêncio do outro lado. Tantos anos dedicados ao lugar e o que recebia agora era tão-somente a indiferença. Sentia-se invisível. Todos pareciam ignorá-lo. Não tivesse recém retornado de um período de descanso, juraria ser coisa da cabeça, produto do estresse. Contudo, estava bem e gozando de plena consciência. Enquanto andava, com os braços escondidos por detrás do próprio corpo, alguns guris cruzavam pelo homem, numa espécie de frenesi de estrelas cadentes. É como se não estivesse ali. No fundo, até que desejara que um daqueles piás lhe esbarrasse, dando a certeza de que tudo aquilo era real. Uma espécie de belisco, capaz de vencer o torpor que, talvez inconscientemente, tivesse-lhe lançado naquele sentimento de modorra crescente. Estaria ali? Começava a duvidar da própria existência, não fosse o desconforto gástrico que o incomodava já há alguns dias. As conversas cruzavam daqui para lá e de lá para acolá. Impossível decifrar aquele emaranhado de vozes e mescla de assuntos. Vez por outra, uma que outra palavra marota fugia ao círculo e vinha soprar junto aos ouvidos do homem. Solta, mais parecia criança sozinha. Era no grupo, com outras palavras e gestos permeados dos mais diversos sentimentos, que encontrava sua razão de ser. Ao que parecia, até elas, as palavras, passavam de largo do pobre homem. Rejeitado. Quase que execrado, mesmo que tacitamente. Sentia na pele o ostracismo que, ainda ontem, discorria em suas aulas. É bem verdade, que exclusão duma outra espécie. Mais perversa. Profundamente dolorosa. Sentia-se estrangeiro em sua própria terra. Pior, um párea destituído de tudo, inclusive do próprio invólucro da alma. Invisibilidade tamanha a ponto de aniquilar o fio condutor da humanidade: o diálogo com o outro. Passara a sentir saudade do confronto, do embate mesmo que áspero. Onde estariam as diferenças? Naquele momento, o consenso soava funesto e sombrio. Ansiava pela voz adversa, tábua de salvação para a profunda tristeza que o assolava. Gritasse, talvez o escutassem. Talvez o vissem. Aspirava por nem que fosse um par de olhos que o resgatasse daquele insuportável anonimato. Olhos da alma, prontos para saudá-lo, acolhê-lo, ressignificá-lo. Ao fundo, mesmo que tímido, o sinal que dera fim ao recreio se mostrara incapaz de pôr fim, também, ao niilismo daquele homem.


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