O PIJAMA
Gilvan Teixeira
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blog:
profgilvanteixeira.blogspot.com.br
Detestava aquele pijama. Não lhe saía da cabeça a
noite em que o maridão dissera ao ouvido dela: “foi a melhor noite de minha
vida”. Maravilha, não fosse o fato dele ter chegado ao ápice após eróticas
esfregas no pijama da companheira. Só no pijama! Ela, por sua vez, ficou a ver
navios... Até que deu algumas indiretas ao infeliz. Sem sucesso. Demorou para “entender”
os apelos da esposa. Quanto a “atender”, parecia fora de questão. A idade
talvez ou, quem sabe, os longos anos de convivência militavam contra o pobre varão.
Ele, até que tentara reacender a chama, todavia esta se esvaíra em meio ao
último espasmo de prazer. O monólogo sexual não fora proposital. Podia jurar
que a mulher estava acompanhando todo aquele frenesi corpóreo. Mal sabia ele
que, no quebrar das ondas, quando se ouve aquele “chuááááá”, era um lobo
solitário. Quanto à mulher, mais lembrava uma andarilha em meio ao deserto. Completamente
seca. Árida e indignada ante o aparente egoísmo do marido. Diante das
explicações do sujeito, a revolta só aumentava. Preterida pelo pijama. Ora
essa! Não bastasse, a infeliz exclamação do parceiro: “foi a melhor noite...”.
Desgraçado. Insensível. Grosso. Por mais extensa que fosse a lista de
impropérios, era um nada diante da indisfarçável raiva da mulher. A vontade que
tinha, por mais que se desculpasse o homem, era aleijá-lo. Nos momentos mais
obscuros do ódio, a mulher parecia ver o marido transformado em eunuco,
enquanto ela, por sua vez, estaria rodeada de meia dúzia de gladiadores
“saradões”, recém-chegados da longa batalha, com as enormes espadas em riste. Tanto
quanto radical, foi efêmera a vingança imaginativa da esposa. Seis homens
mijando fora do vaso, cheirando a cerveja, soltando flatulências mal cheirosas,
bagunçando o orçamento doméstico... Não, nem pensar. Melhor só um. Mesmo que fosse
aquele infeliz. Não bastasse o infortúnio causado pelo traste, teria ainda que
lavar o maldito pijama. O marido, ante o mal-estar causado, já não sabia o que
dizer. Ampliara, de última hora, o rol de elogios: ninfeta, rainha, sereia.
Diante da cara amarrada da esposa, apelara para o outro extremo: piranha,
vagabunda, messalina... Nada, nem sinal de perdão. Pelo visto, a noite seria
longa. Pior era ter de acordar e encarar a mulher nos olhos, enquanto lá fora,
estendido no varal, estaria o pijama com aquele ar da mais pura satisfação.
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