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quinta-feira, 18 de julho de 2013

O PIJAMA


O PIJAMA
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                Detestava aquele pijama. Não lhe saía da cabeça a noite em que o maridão dissera ao ouvido dela: “foi a melhor noite de minha vida”. Maravilha, não fosse o fato dele ter chegado ao ápice após eróticas esfregas no pijama da companheira. Só no pijama! Ela, por sua vez, ficou a ver navios... Até que deu algumas indiretas ao infeliz. Sem sucesso. Demorou para “entender” os apelos da esposa. Quanto a “atender”, parecia fora de questão. A idade talvez ou, quem sabe, os longos anos de convivência militavam contra o pobre varão. Ele, até que tentara reacender a chama, todavia esta se esvaíra em meio ao último espasmo de prazer. O monólogo sexual não fora proposital. Podia jurar que a mulher estava acompanhando todo aquele frenesi corpóreo. Mal sabia ele que, no quebrar das ondas, quando se ouve aquele “chuááááá”, era um lobo solitário. Quanto à mulher, mais lembrava uma andarilha em meio ao deserto. Completamente seca. Árida e indignada ante o aparente egoísmo do marido. Diante das explicações do sujeito, a revolta só aumentava. Preterida pelo pijama. Ora essa! Não bastasse, a infeliz exclamação do parceiro: “foi a melhor noite...”. Desgraçado. Insensível. Grosso. Por mais extensa que fosse a lista de impropérios, era um nada diante da indisfarçável raiva da mulher. A vontade que tinha, por mais que se desculpasse o homem, era aleijá-lo. Nos momentos mais obscuros do ódio, a mulher parecia ver o marido transformado em eunuco, enquanto ela, por sua vez, estaria rodeada de meia dúzia de gladiadores “saradões”, recém-chegados da longa batalha, com as enormes espadas em riste. Tanto quanto radical, foi efêmera a vingança imaginativa da esposa. Seis homens mijando fora do vaso, cheirando a cerveja, soltando flatulências mal cheirosas, bagunçando o orçamento doméstico... Não, nem pensar. Melhor só um. Mesmo que fosse aquele infeliz. Não bastasse o infortúnio causado pelo traste, teria ainda que lavar o maldito pijama. O marido, ante o mal-estar causado, já não sabia o que dizer. Ampliara, de última hora, o rol de elogios: ninfeta, rainha, sereia. Diante da cara amarrada da esposa, apelara para o outro extremo: piranha, vagabunda, messalina... Nada, nem sinal de perdão. Pelo visto, a noite seria longa. Pior era ter de acordar e encarar a mulher nos olhos, enquanto lá fora, estendido no varal, estaria o pijama com aquele ar da mais pura satisfação.



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