O HOMEM QUE NINGUÉM VIA
Gilvan Teixeira
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Passeava pelo pátio da escola. Alguns minutos do
recreio já tinham se ido. A gurizada formava grupos aqui e acolá. Alguns mais
numerosos, outros não mais do que duplas. Por mais que insistisse – Bom dia!
Bom dia! Tudo bem? Tudo bem? – ninguém respondia. Só silêncio do outro lado. Tantos
anos dedicados ao lugar e o que recebia agora era tão-somente a indiferença.
Sentia-se invisível. Todos pareciam ignorá-lo. Não tivesse recém retornado de
um período de descanso, juraria ser coisa da cabeça, produto do estresse. Contudo,
estava bem e gozando de plena consciência. Enquanto andava, com os braços
escondidos por detrás do próprio corpo, alguns guris cruzavam pelo homem, numa
espécie de frenesi de estrelas cadentes. É como se não estivesse ali. No fundo,
até que desejara que um daqueles piás lhe esbarrasse, dando a certeza de que
tudo aquilo era real. Uma espécie de belisco, capaz de vencer o torpor que,
talvez inconscientemente, tivesse-lhe lançado naquele sentimento de modorra
crescente. Estaria ali? Começava a duvidar da própria existência, não fosse o
desconforto gástrico que o incomodava já há alguns dias. As conversas cruzavam
daqui para lá e de lá para acolá. Impossível decifrar aquele emaranhado de
vozes e mescla de assuntos. Vez por outra, uma que outra palavra marota fugia
ao círculo e vinha soprar junto aos ouvidos do homem. Solta, mais parecia
criança sozinha. Era no grupo, com outras palavras e gestos permeados dos mais
diversos sentimentos, que encontrava sua razão de ser. Ao que parecia, até
elas, as palavras, passavam de largo do pobre homem. Rejeitado. Quase que
execrado, mesmo que tacitamente. Sentia na pele o ostracismo que, ainda ontem,
discorria em suas aulas. É bem verdade, que exclusão duma outra espécie. Mais
perversa. Profundamente dolorosa. Sentia-se estrangeiro em sua própria terra.
Pior, um párea destituído de tudo, inclusive do próprio invólucro da alma.
Invisibilidade tamanha a ponto de aniquilar o fio condutor da humanidade: o
diálogo com o outro. Passara a sentir saudade do confronto, do embate mesmo que
áspero. Onde estariam as diferenças? Naquele momento, o consenso soava funesto
e sombrio. Ansiava pela voz adversa, tábua de salvação para a profunda tristeza
que o assolava. Gritasse, talvez o escutassem. Talvez o vissem. Aspirava por
nem que fosse um par de olhos que o resgatasse daquele insuportável anonimato. Olhos
da alma, prontos para saudá-lo, acolhê-lo, ressignificá-lo. Ao fundo, mesmo que
tímido, o sinal que dera fim ao recreio se mostrara incapaz de pôr fim, também,
ao niilismo daquele homem.