Translate

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

DIRETRIZES: FOCO NA APRENDIZAGEM



DIRETRIZES: FOCO NA APRENDIZAGEM
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                As chamadas Diretrizes para o Ensino Fundamental de Nove Anos[1] construída ao longo de anos e consolidada na Resolução CME No 015/2012, representa um importante avanço no que tange ao olhar que se lança sobre a aprendizagem. Esta – e não a mera aprovação ou reprovação – passa a ser o centro das atenções. Parte-se da ideia de que todos aprendem, embora de formas e em tempos diferentes. O que deve merecer destaque não é a terminologia atribuída à nova organização curricular: módulos de aprendizagem. O que deve pautar a discussão e reflexão são os paradigmas existentes por detrás da iniciativa. A coletividade, representada pelo Conselho Municipal de Educação de Cachoeirinha, buscou acima de tudo garantir maior tempo tanto ao educando, para que o mesmo aprenda, quanto ao educador, para que este ensine. A Organização Modular busca, ainda, fomentar maior planejamento por parte dos professores, pois que passam a ser “solidários” uns para com os outros em relação ao processo ensino-aprendizagem. Na prática, isso significa que os educadores dos anos seguintes (finais, por exemplo) terão de sentar com os colegas dos anos anteriores, pois responderão solidariamente pela aprendizagem, ou não, do educando. Sepulta-se o trabalho pautado no individualismo, onde cada qual ficava no seu “quadrado”. Enquanto os educadores se digladiavam, jogando uns sobre os outros a culpa da não-aprendizagem da criança/adolescente, o educando ficava à mercê de sua sorte ou, o que era pior, acabava por se transformar no “vilão” de seu próprio infortúnio.

                A primeira grande mudança trazida pela Organização Modular de Aprendizagem diz respeito ao “tempo”. Este foi redimensionado. Antes, o educando tinha tão somente um ano letivo (na prática, cerca de nove meses...) para dar conta de aprender os conteúdos mínimos previstos no famigerado Plano de Estudos. O que para alguns alunos era tranquilo, para outros era fator de desespero e, por consequência, de fracasso escolar (reprovação). A nova Organização aumenta o tempo para 03 (três) anos, para que o aluno seja melhor trabalhado, para que seja utilizado o maior número possível de estratégias de aprendizagem voltadas ao sucesso de fato do educando. Mais do que uma questão de “Direito” (respaldado na Constituição Federal e em diversos outros diplomas legais), é uma questão de ética e de dignidade da pessoa humana. A escola só faz sentido se for capaz de ensinar. Assim como é inadmissível que o paciente seja dispensado pelo hospital antes de resolvido seu problema de saúde, da mesma forma é inadmissível que o educando seja “dispensado” (a reprovação por certo exclui...) da escola sem que aprenda. A reprovação escolar deve ser vista e comparada com a morte, portanto uma exceção, possível de acontecer, mas tratada como luto, eivada de tristeza e sentimento de perda. Infelizmente, contudo, não é o que se vê. Os índices de reprovação, especialmente nas escolas públicas (por quê?), só são menores do que a modorra que se mistura à omissão, passividade e indiferença. Reprova-se com naturalidade e quase desenvoltura. Levas e mais levas de educandos veem o futuro ser enterrado envolto às folhas de provas não raras vezes mal elaboradas e que nada atestam senão a incapacidade do professor e da escola de encontrarem saídas que promovam a aprendizagem.

                Outra importante mudança diz respeito à reprovação em si. Esta “só” poderá ocorrer ao final de cada módulo (três anos). Assim, por exemplo, o aluno que ingressa no 1o ano do Ensino Fundamental não poderá ser reprovado antes que alcance o 3o ano. Somente ao final deste último ano do módulo é que – caso se faça comprovadamente necessário – o educando poderá ser retido. Resta clara, portanto, a intenção do Conselho Municipal de Educação em lançar uma verdadeira e profunda mudança de paradigma e não simplesmente criar estratégias voltadas à redução dos índices de reprovação. Busca-se deslocar o foco da mera questão da “aprovação/reprovação” para uma outra, a da “aprendizagem”.

                As Diretrizes Municipais para o Ensino Fundamental de Nove Anos instigam as mudanças que há muito se fazem necessárias. Urge maior planejamento e estreitamento da comunicação entre todos os que respondem pelo processo ensino-aprendizagem, de forma especial, o corpo docente. O que se vê é uma enorme distância entre o espírito trazido na legislação hodierna e o cotidiano das instituições de ensino. Apesar dos avanços legais atinentes à tão decantada “gestão democrática” (seguida da descentralização financeira, do surgimento e fortalecimento dos Conselhos Escolares, etc.), a escola segue – salvo raras e louváveis exceções – com a mesma prática do mais longínquo passado. A comunidade só é lembrada e chamada à participação em situações excepcionalíssimas. Via de regra, os membros dos ditos “Conselhos” não passam de meros espectadores ou, o que não deixa de ser pior, espécie de “extensão” da Direção, incapazes de fazerem o contraponto indispensável à reflexão crítica, esta última matéria-prima das mudanças tão necessárias no âmbito da escola. Leva-se para dentro das instituições de ensino as mesmas práticas e vícios de seu entorno. Tem sido por demais comum a “partidarização” das relações intramuros. Negociatas, troca de favores, privilégios, confusão entre público e privado e toda espécie de mesquinhez tão criticadas em relação à política partidária neste município, estado e país, acabam por se fazer presentes também na esfera da escola. Portanto, não causa estranheza o preocupante afastamento da comunidade em relação às instituições de ensino. O “esvaziamento” e constante “rodízio” entre os componentes dos Conselhos Escolares são meros sintomas das práticas equivocadas levadas a cabo pelas escolas.

                A Resolução que trata das Diretrizes reforça a necessidade, portanto, do planejamento. A escola deve garantir o tempo e espaço necessários para que, por exemplo, o corpo docente estude, debata, avalie, construa de forma coletiva. Reuniões entre professores do mesmo módulo e de módulos distintos têm que ser uma constante. As questões pedagógicas devem se sobrepor às administrativas e o tempo disponibilizado ao planejamento do grupo deve se sobrepor ao individual. Portanto, há de se repensar sim questões como a da “hora atividade”. Esta não deve ser vista ou confundida com “folga”. O planejamento deve se dar é na escola, não em casa. Esta é local de descanso, enquanto a instituição de ensino é espaço para o trabalho e exercício responsável da função para a qual o servidor é remunerado. Mister é que as reuniões envolvendo o corpo docente sejam orientadas e acompanhadas pela Supervisão Escolar. Para tanto, indispensável é que os supervisores se qualifiquem e se instrumentalizem. O estudo e a pesquisa devem ser uma constante. O grupo docente deve ser instigado a falar, se posicionar e se comprometer. Exige-se resultados. Trabalho sem resultado é estéril, de nada vale. Os resultados devem, portanto, aparecer sob diversas formas: diminuição da infrequência e da evasão; diminuição da indisciplina; melhoria na aprendizagem; maior participação da comunidade; melhoria na saúde do profissional da educação com a consequente diminuição das faltas laborais; etc.

                As Diretrizes Municipais para o Ensino de Nove Anos – como já dito – busca realocar os holofotes, posicionando-os sobre a questão da aprendizagem. Por óbvio, não se quer olvidar a importância da questão aprovação/reprovação. Esta precisa sim ser discutida, contudo à luz de outros paradigmas que não aqueles que até então vêm ocupando a atenção. A reprovação precisa ser vista, primeiro, como uma exceção. Tratada como uma “anomalia”, portanto algo passível de despertar inúmeros cuidados para que não se repita. Infelizmente, não são poucos os professores que a usam como “instrumento” de pressão e de “pseudo-controle” contra a indisciplina escolar. Acreditam alguns que a ameaça de eventual reprovação sirva de estímulo para a melhoria do comportamento dos educandos e maior comprometimento da família. Triste engano. A experiência tem mostrado que seja a reprovação, seja sua “simples” ameaça, não traz os resultados pretendidos. Como toda punição ou como toda ameaça, ao ser banalizada (e hoje a reprovação é algo “banal”!), por certo não produz os efeitos desejados. Ao contrário, só faz desgastar e fragilizar as relações de afeto. Ora, a indisciplina escolar, por exemplo, precisa ser atacada, mas não através da reprovação. A indisciplina precisa ser entendida, compreendida em suas causas. Quando, onde, com quem ocorre? A quebra dos chamados princípios de convivência deve ser encarada como um problema a ser resolvido. Reprovar o educando significa atacar a pessoa do “agressor” e não sua conduta. Ora, é esta última que precisa ser combatida e banida! O aluno indisciplinado precisa ser cobrado e responsabilizado, mas acima de tudo ensinado (por isso está na escola...) e amado, respeitado como sujeito de direitos. O combate efetivo à indisciplina escolar passa por uma série de iniciativas. Deve haver clareza e publicização dos princípios de convivência. As regras estabelecidas (é bom que algumas delas sejam construídas) precisam ser pertinentes, coerentes e justas. É fundamental que se diminua significativamente a distância entre o discurso e a prática docentes (o professor deve cobrar pontualidade, mas ser pontual; deve exigir organização dos alunos, mas estar com seus cadernos de chamada em dia; pedir concentração dos educandos, mas mostrar-se mais atento e menos “tagarela” nas reuniões e encontros de formação...). A família precisa ser comunicada e, se necessário, chamada quando diante de atos de indisciplina. Não se fazendo presente, mister é que seja responsabilizada. As instituições de ensino precisam otimizar seus recursos, usar de suporte tecnológico no combate à indisciplina. Indispensável, ainda, é que haja o cuidado com os registros envolvendo alunos indisciplinados. Enfim, como se vê, muitas são as alternativas e caminhos para que a escola supere ou, ao menos, mitigue o problema da indisciplina, sem que lance mão da reprovação.

                A Resolução exarada pelo Conselho Municipal de Educação de Cachoeirinha, ao trazer a necessidade da aprendizagem para o centro das atenções, reafirma algumas certezas. Uma delas é a que diz respeito ao papel do ente público (representado pela Secretaria Municipal de Educação - SMEd) no processo de melhoria da qualidade do ensino, pressuposto indispensável a real e verdadeira aprendizagem. Primeiro, cabe à mantenedora criar mecanismos que contribuam para a assimilação do conteúdo trazido pela norma. As Equipes Diretivas (articuladas e auxiliadas pela Assessoria Pedagógica da SMEd) devem servir de “multiplicadores”, instigando os docentes em suas respectivas unidades de ensino a também se apropriarem das Diretrizes, em que pese o adiantado da hora. O momento, agora, já não é o da construção da norma, mas de sua operacionalização. O que fazer? Como fazer? Eis aí as perguntas e questionamentos a serem feitos. Apesar das eventuais críticas que venham a surgir – naturais, por sinal –, por parte da comunidade escolar (especialmente de alguns professores), cabe à Equipe Diretiva criar as condições necessárias para que as Diretrizes saiam do papel. As Propostas Político-Pedagógicas precisam ser construídas tendo por pano de fundo o regramento trazido pela Resolução.

                Ao Poder Público cabe, ainda, criar e garantir as condições físicas, estruturais e de recursos humanos necessárias à consecução da norma. O sucesso da empreitada passa necessária e obrigatoriamente pela qualificação profissional, pela melhoria e ampliação de alguns espaços junto às escolas, pela parceria da SMEd com outras Secretarias, pelo suporte financeiro e técnico às instituições de ensino, pela formação continuada, pela valorização salarial, pela presença constante da Assessoria junto às escolas, pelo diálogo permanente com as entidades de classe (SIMCA), pela oitiva da comunidade, entre outros. O momento requer soma de esforços e convicção em relação às decisões trazidas pela Resolução. Não se pode, agora, titubear. Exige-se compromisso, responsabilidade, profissionalismo e o trabalho de todos. O aluno merece!


[1] O texto é de inteira responsabilidade do autor, portanto não refletindo necessariamente a posição do Conselho Municipal de Educação de Cachoeirinha. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário