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quinta-feira, 27 de junho de 2013

EMBARCAÇÕES


EMBARCAÇÕES
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br




                Feito embarcação, a escola por vezes se vê envolta em mar encapelado. Escolas fazem lembrar embarcações. Algumas parecem jangadas, pequenas, aparentemente frágeis, mas com imensurável capacidade de transportar sonhos. Outras escolas são maiores, lembrando ou cargueiros – brutas em sua arquitetura – ou verdadeiros transatlânticos, tamanho o luxo e conforto que ostentam. Todas as escolas, contudo, têm algo em comum: o mar por onde navegam. As águas são as mesmas e os desafios, em regra, guardam enorme semelhança. Mais do que o tamanho ou imponência da embarcação, o que garante ou não a sensação de segurança e serenidade é a disposição de quem navega. Disposição em chegar ao porto, disposição em curtir a viagem, disposição em contemplar o que de melhor oferece o mar. Este assusta e encanta. O mesmo mar dos corais, golfinhos, jubartes e tartarugas é o mar das ondas gigantes, icebergs e vendavais. Cada um fixa o olhar naquilo que o coração aponta. Alguns atentam somente para os riscos e eventuais perigos do mar. Mesmo com os pés secos, parecem e agem como se náufragos fossem. Embora vivos, jazem numa espécie de sarcófago interior. Até o cheiro os aproxima do mundo subterrâneo. A visão turva e cinzenta impede-lhes de vislumbrar além do próprio umbigo. Outros viajantes, porém, acompanham – numa bela dança corporal – o gingar das ondas do mar. Por meio da imaginação, lançam voo com as gaivotas e pastoreiam o rebanho de alvas nuvens. Juntam os pontinhos luminosos do céu, formando corações, flores e figuras abstratas. Verdadeiros artistas. Anônimos talvez, mas amantes das artes, das letras e, antes de tudo, dos homens. Tem escolas – quase sempre públicas – que mais parecem sobras de embarcação, tamanha precariedade. Não fosse a obstinação dos que, por vezes desesperadamente, agarram-se aos “destroços”, sumiriam, em meio à imensidão de água salgada. Homens e mulheres esfarrapados, enfiados no que sobrou dos guarda-pós, que, apesar da sede e da fome, teimam em não abandonar suas utopias. Otimistas, não desistem de sonhar, em que pese saberem que o que veem muitas vezes são nada mais do que miragens. Escolas fazem lembrar embarcações. Quem nelas trabalha, ali está para servir. À tripulação cabe acolher, oferecer o que há de melhor aos passageiros. Incluí-los. Encantá-los. Desejá-los. Escola vazia é embarcação à deriva. Navio fantasma, sem vida, frio, sepulcral. O que seria da prataria, dos lençóis de seda, da comida farta, sem os passageiros? O prazer do timoneiro está, sobretudo, em alcançar seu norte. Este, por sua vez, confunde-se com o destino do “outro”. O professor inexiste sem o aluno. Confundem-se. Relação, por certo, umbilical, daí ser necessária e irremediavelmente profunda. Feito as águas do mar. Escolas fazem lembrar embarcações. 

Ver:
http://www.institutosaofrancisco.com.br/site/artigos_visualizar.php?artigo_autenticacao_=291e0142b29f69a48e79e5b75bd7c024

2 comentários:

  1. Só a utopia dos timoneiros para conduzir esta barca junto com os alunos. Parabéns pela analogia e parabéns pelo estilo literário.

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  2. Amigo e sempre professor Osmar, infelizmente a utopia tem sido uma virtude intrínseca cada vez mais rara. Não por acaso, a sala de aula tem sido verdadeiro Saara de criatividade e construção do conhecimento. Não são as novas (e caras!) tecnologias que fazem a diferença, mas é o acreditar no ser humano. Abraço fraterno deste teu admirador. Gilvan.

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