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quinta-feira, 6 de junho de 2013

OVOS OU BACON?


OVOS OU BACON?
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                O Brasil está discutindo educação. Municípios do país afora estão a discutir o documento “referência” da Conferência Nacional de Educação (CONAE 2014) que culminará, no próximo ano, num grande encontro na capital federal. Inúmeras são as proposições que embasam o movimento, muitas delas “remixadas” e requentadas, fazendo lembrar as proposições da CONAE anterior (2010). Não que tais propostas careçam de importância. Muito pelo contrário. Contudo, o que salta aos olhos é o quanto neste país tem sido difícil superar o limite do mero discurso. Os problemas apontados lá atrás, em sua grande maioria, não apenas permanecem, como (o que é mais preocupante!) se tornaram mais graves e mais dramáticos. O ensino, principalmente público, neste país é desesperador. Descaso, malversação de recursos, corrupção, incompetência, precariedade das escolas, salários aviltantes pagos aos profissionais da educação, corporativismo classista, indiferença e letargia da comunidade no que tange à efetiva participação junto à escola, fracasso escolar, evasão, pífio nível de aprendizagem, são apenas alguns dos tristes “sinais” de que o ensino vai de mal a pior. Além de parcos (luta-se por garantir dez por cento do Produto Interno Bruto, PIB, para investimentos no ensino público), os recursos não são otimizados. Os resultados obtidos são vexatórios. Não raras vezes, a preocupação com as estatísticas (de preferência “simpáticas” às políticas de governo adotadas...) supera a preocupação com a “essência”. Doura-se a pílula como se fosse possível esconder um cadáver em avançado estado de putrefação sob o belo tapete da sala de estar. Aparências... Há alguns dias, ouvi – durante a Conferência Intermunicipal da CONAE 2014, envolvendo Cachoeirinha e Glorinha (dois municípios do Rio Grande do Sul) – uma curiosa fala da palestrante. Afirmara que não basta “envolvimento” para mudar o ensino neste país. É necessário, segundo ela, “comprometimento”. Para ilustrar tal assertiva, a conferencista comparou a galinha e o porco. Enquanto a primeira, em regra, apenas “se envolve” na tarefa de pôr o ovo, sem o compromisso de chocá-lo, o porco, ao contrário, deve entregar-se por inteiro para que dali saia o bacon. Este jamais existiria não fosse o verdadeiro sacrifício do bicho. Inexiste espaço para escamoteio, “corpo mole”, indiferença, omissão, transferência de responsabilidade, “terceirização”. É vai ou racha! Bacon sem dor, sem “doação”, sem “paixão” (sei que o porco, coitado, deve estar discordando...) não existe. O ensino, assim como a educação como um todo (aqui entendida como algo mais amplo e complexo do que o processo que se dá no seio da escola), precisa de mais bacon e de menos ovos. Urge pessoas comprometidas com a árdua, mas urgente e necessária, tarefa de mudar os rumos da educação neste país. Mister é que o bacon esteja à “mesa” das famílias, gabinetes, escolas, conselhos de direitos, sindicatos, entre outros. Faz-se necessário que a “gordura” dele unte as relações e permeie as ações. É gordura da boa, ao contrário daquela historicamente produzida, em larga escala, pelo Estado brasileiro. Este último tem entupido as artérias e veias que alimentam a esperança do povo. Chega de gordura que entorpece, ludibria e aliena. Gordura que satura. Gordura que, não raras vezes, nos é enfiada goela abaixo sob a forma de ovos coloridos e aparentemente doces, tão comumente distribuída em estádios de futebol, passarelas do samba, novelas e inúmeros outros “espetáculos” circenses. A quem cabe mesmo o papel de palhaço? O produto da galinha não é de todo ruim, mas socialmente insuficiente e de baixíssimo potencial revolucionário. O porco, por sua vez, apesar da sorte que lhe aguarda, traz consigo, por debaixo da pele às vezes rude e plasticamente pouco invejável, a poderosa “gordura” capaz de subverter estruturas e grilhões que aprisionam nossa gente e perpetuam as infames desigualdades. Viva o bacon! 

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