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sexta-feira, 15 de junho de 2012

A PRIMEIRA VEZ


A PRIMEIRA VEZ
Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com


                Não conseguia esconder o nervosismo. As pernas tremiam. O coração, palpitante, parecia não caber no peito, ansioso por sair pela boca. A respiração sôfrega a exigir esforço hercúleo. A pressão arterial, a medisse, certamente estaria nas nuvens. Apesar do ar condicionado, já de véspera ligado, o coitado suava. Suor frio. Os sentimentos misturavam-se, verdadeiro amálgama de pavor e sedução. Feito a fruta do Éden. Proibida, talvez por isso desejada. Ao olhar aquelas curvas, a maciez aveludada que envolvia a silhueta onde logo depositaria seu corpo, estremecia de prazer. Há quanto tempo aguardava aquele momento. Não faz muito, em meio à roda de amigos, zombavam dele. Talvez fosse o único a não ter experimentado daquele “fruto”. Quem sabe, ainda, fosse puro despeito. O fato é que, no fundo, sentia-se pequeno, menosprezado diante de tantas narrativas alheias a falarem da singular experiência de sentir-se nas nuvens. Narravam a ele cada detalhe, dos banais aos mais picantes, talvez com o intuito de vê-lo sofrer. Ao perceberem que se interessava pelas minúcias, por certo logo deduziam que o pobre era um profundo desconhecedor daqueles “assuntos”. Aí é que o espezinhavam. Falavam das mais variadas e possíveis “posições”. Tinham os que diziam preferir sentados. Outros, ao contrário, defendiam a tese de que de pé era melhor, não fossem as dificuldades de aguentar os solavancos, especialmente quando a “coisa” estava já lá em cima. Alguns preferiam que fosse a dois, outros alegavam que quanto maior o grupo melhor: “é mais divertido!”. Obviamente, não podia deixar de ter sempre o que preferia fazer aquilo sozinho. Gosto não se discute. Alguns admitiam que com um companheiro do mesmo sexo até que poderia ser interessante. Poderiam aproveitar o ensejo para falar de coisas em comum. A maioria, contudo, preferia que fosse com mulheres, de preferência bonitas e de peitos avantajados. Tá bom, até poderiam ser feias, mas os peitos... Afinal, era coisa rápida. Uma ou duas horas. A não ser quando se quisesse ir mais longe... Toda aquela conversa só atiçava nele a necessidade de também deliciar-se. Por que não sentir prazer? Mesmo que pago. Conversa ia e conversa vinha, não tardava, logo soltavam a fatídica pergunta: “e aí, vai ou não vai?”. Sentia, por detrás daquele desafio, uma ponta de maldade. Não tinha dúvida. Mais cedo ou mais tarde iria à desforra. Apesar da idade um tanto que avançada, ia para lá dos quarenta, nunca era tarde para começar. O que perdia, por um lado, em relação ao viço da juventude, por outro ganhava quanto à experiência. O tempo, para alguns, tido por inimigo, para ele era aliado. Propiciara-lhe um olhar agudo, perspicaz, refinado. Os cabelos descoloridos atestavam o equilíbrio e a estabilidade que só os anos são capazes de trazer. Enquanto todos esses sentimentos, pensamentos e emoções o rodeavam, a luminosidade do ambiente diminuía, prenunciando o grande momento. Só em pensar que na hora agá poderia falhar, sentia náusea. Apesar de, ao longo de tantos anos, preparar sua mente para quando o momento chegasse, ainda assim não conseguia disfarçar o medo. Não sabia ao certo se segurava a mão, se puxava conversa, se abria ou fechava os olhos... Temia que fosse mal interpretado ou que fosse tido por fraco e pouco viril. Buscava mentalizar coisas boas. Tudo daria certo. Na hora de levantar, não decepcionaria. Por que com ele seria diferente? Ora, se os amigos conseguiam, por que não conseguiria? A tensão que o atormentava certamente os afligira também. Mesmo que relutassem em admitir. Tinha certeza de que na segunda ou terceira vez, tudo seria mais fácil. Inclusive as preliminares. Como a eterna celeuma entre o dia e a noite, assim eram seus pensamentos naquele instante. Revezavam-se entre bons e ruins. Ele, coitado, feito vítima, mais parecia um ser inanimado. Mal piscava. Queria parecer forte, imponente, senhor de si. Que nada. Cada músculo de seu corpo parecia denunciar o verdadeiro pavor que, vez por outra, o assombrava. Só em pensar que o êxtase poderia se transformar em tragédia, o fazia arrepiar. O delicioso perfume de mulher a pairar no ar, que para alguns despertava sentimentos um tanto que profanos, para ele passava despercebido, tamanho a insegurança que o afligia. Por sinal, quem seria ela? Nome, por que perguntar? Não faria diferença. Não estavam ali para isso. Sem sentimentalismo ou compromisso. Talvez fosse casada, ou não... Era uma mulher de “presença”, apesar da natureza não ter sido muito generosa com sua beleza. Quanto aos peitos... Era loira, talvez um e sessenta ou setenta. Idade? Perto dos trinta talvez. Não tinha idade para ser sua filha, o que era motivo de certo alívio. Já pensou se o chamasse de “tio”? Até podia imaginar... O troço subindo, subindo e, quando já lá em cima, ser chamado de “tio”? O desconforto seria notório. Já não bastasse ter que manter a calma, o sangue a encher-lhe os vasos, ainda ter que ouvir tal disparate? Até por isso, estava decidido em manter-se, tanto que possível, calado. Lado a lado, aqueles corpos sedentos de vida. O dele suado, dado o esforço que fazia para enfrentar tamanho desafio. Ela, ao contrário, aparentava muita calma, quase frieza. Fruto, talvez, de sua provável experiência. Antes dele, quantos mais estiveram junto àquele corpo felino? Quantas e quantas vezes, ela não vira a “coisa” subir? Não queria decepcioná-la. Tremia só em pensar ser motivo de chacota nas futuras rodas de amiga daquela mulher. Pernas para cá, braços para lá. Esperava que fosse mais espaçoso o lugar, mas não. Era um “buraquinho” tanto que apertado. Foi com alguma dificuldade que conseguiu enfiar-se ali dentro, com algum desconforto. Ela, contudo, parecia indiferente aos esforços do coitado. Sequer esboçava um olhar. Nenhum ai, nenhuma reclamação, nenhum elogio. Nada, nada... O ar de superioridade da mulher só fazia aumentar a aflição do pobre homem. Torce daqui, contorce de lá, o que era para ser prazer, aos poucos ia se transformando em indelével e insuportável pavor. Precisava ir ao banheiro. Temia pelo que ela pudesse pensar. Pior, o que dizer aos amigos? Mentir? Dizer que foi inesquecível, ou abrir o jogo e reconhecer seu fracasso. Já podia ouvir as piadinhas e deboches. Preferia, talvez, não mentir, mas omitir alguns “pontos” da aventura vivida. Ressaltar, quem sabe, a beleza da mulher, o tamanho de seus peitos... Jamais, contudo, tocar ou permitir tocar no assunto atinente ao ápice do negócio, que é quando o “troço” sobe. Era desconversar e pronto! O banheiro era pequeno, mas asseado. Sabonetinho de motel, toalhinha macia, um mimo. Enfiado ali dentro, buscava mentalizar, mais uma vez, que tudo iria dar certo: vai dar certo, vai dar certo, vai dar certo... Não deu! Um profundo mal estar o tomou por completo. Jogou uma água na nuca, respirou fundo e contou até dez. Depois até vinte. Procurou acalmar-se. Retornou para o lugar. Ela continuava lá, do mesmo jeito que a deixara. Sequer lançou um olhar, muito menos comentário ou algo que o valha. Apesar de tão próximos, pareciam tão distantes, cada um no seu próprio mundo. Sentia-se cansado. Só ficou mais tranquilo quando, finalmente, o avião em que estava aterrissou. 

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