ALGODÃO
ENTRE CRISTAIS
Prof. Gilvan
Teixeira
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blog:
profgilvanteixeira.blogspot.com.br
A frase do Ministro Marco Aurélio Mello, do STF,
quando da discussão acerca de sua decisão irresponsável, que levou à soltura de
um grande traficante, é emblemática. Dirigindo-se ao Presidente da Corte, disse
que o mesmo deveria ser como “algodão entre cristais”. Como devemos interpretar
a fala do Ministro (com letra maiúscula, para não ofendê-lo...)?
Corporativista, arrogante, presunçosa... O certo é que o “ato falho” deixa às
claras como ele – assim como a maioria de seus pares – se vê. A postura do
Excelentíssimo Ministro é da mesma linhagem do “você sabe com quem está falando?”
(DaMatta), típica de um país ainda preso a um passado colonial e escravista,
onde a vez e a voz pertenciam (passado?) aos coronéis. Curiosamente, foi o
Digníssimo Ministro indicado pelo primo, sabidamente um descendente dos
coronéis de Alagoas. Com a devida vênia, quiçá, pura “coincidência”. A Suprema Corte, que deveria reunir o que há
de melhor e mais competente na carreira da magistratura, é a cara de um Brasil ainda
oligárquico, onde uma ínfima minoria goza de privilégios – ainda que sob a
roupagem de legalidade (quem faz as leis?) – sustentados por uma maioria que há
muito vegeta na penúria, na falta de oportunidades, na omissão criminosa de um
Estado mastodôntico e ineficiente. Para que os “cristais” e “algodões” (farinha
do mesmo saco, pois fosse no universo da periferia tal conluio seria tipificado
como “organização criminosa”) existam, há que se ter, no mínimo, quem os
reconheça como tais, que os valorize como tais. Que sociedade é esta onde os “cristais”
valem mais do que aqueles que os pagam? Não terá passado da hora de colocarmos
os “pingos nos is”, os “bois na frente da carreta” e os “cristais” em seu devido
lugar? Dizem que uma omelete só faz quebrando os ovos. Não será o momento de
quebrarmos os “cristais” para que entendam a quem, de fato, pertencem? O
escárnio nascido no pomposo Plenário da Suprema Corte não surpreende, mas
apenas revela o quanto estamos distantes do verdadeiro sentido do que seja um “servidor
público”. Como bem lembra Cortella, “um poder que se serve, em vez de servir, é
um poder que não serve”. A presente Corte não serve, pois que fruto de
indicações políticas e descompassada com os novos tempos. Um STF incapaz de
compreender o real sentido e utilidade do garantismo, cego pelo brilho dos “cristais”
como se estes últimos fossem um fim em si mesmos. Uma Corte mais preocupada com
as ignóbeis vaidades pessoais (e dos grupos aos quais representam) e perdida em
verborreias jurídicas vazias (a palavra é poder) do que com a aplicação da
justiça. Seja o Supremo o farol último do bom Direito e não o covil daqueles
que buscam a impunidade. Torço pelo dia em que os verdadeiros “cristais” ocupem
as confortáveis cadeiras da Corte, refletindo não o brilho de egos, mas de um
povo sadio, próspero, feliz e confiante em suas instituições.
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