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quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

“ALUNO É PARÂMETRO DELE MESMO”


“ALUNO É PARÂMETRO DELE MESMO”
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br

            “O aluno é parâmetro dele mesmo!”. Quem já não ouviu o chavão? A afirmação, revestida de uma aparente aura acadêmica, ao que tudo indica, diz quase nada. Afinal, o que é “parâmetro”? Conceitos acerca do vocábulo temos de sobra. Usemos, a título de exemplo, uma das definições trazidas pelo Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. Segundo ele, “parâmetro é aquilo que serve de base ou norma para que se proceda à avaliação de qualidade ou quantidade”. Parâmetro pressupõe, portanto, aquilo já existente. Qual é o “parâmetro” que o aluno possui? Qual é a distância ou diferença entre o que ele hoje demonstra saber (habilidades e competências desenvolvidas) comparado ao que apresentava ao iniciar o bimestre, trimestre, semestre, ano ou algo parecido? Ao que tudo indica nem ele e nem tampouco o professor ou a escola sabem. Buscando, consciente ou inconscientemente, responder a tão complexo questionamento apela-se, no meio pedagógico, a teorias que nada mais são do que evasivas a revelarem o profundo desconhecimento quanto ao processo ensino-aprendizagem. Não apenas “desconhecimento”, mas, por vezes, despreparo, acomodação e até mesmo certa arrogância professoral na difícil tarefa de avaliar o educando. Talvez, ainda, temor em levar a fundo a avaliação em relação ao “outro”, afinal isso é também “avaliar-se”, debruçar-se sobre o próprio trabalho, correndo o risco de – muito provavelmente – precisar mexer no planejamento já amarelado pelo tempo, repensar a metodologia há anos adotada ou quebrar a cabeça na (re)montagem das velhas questões de prova. Tem sido comum, ainda, educadores/escolas propugnarem pela máxima de que “os aspectos qualitativos devem prevalecer sobre os quantitativos”, fazendo uma interpretação equivocada, senão bizarra, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A Lei Federal no 9.394/96 traz:
Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns:
[...]
V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
[...]
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos;
[...]

            Muitas escolas/professores traduzem os “aspectos qualitativos” como estando relacionados à postura do educando frente aos componentes curriculares, dando ao aluno uma “nota” (ou equivalente) pelo comportamento, organização, pontualidade, respeito às regras da escola, entrega de trabalhos, etc.. Ledo engano daqueles que assim procedem, pois os referidos atributos não passam de mera obrigação (inclusive contratual) do discente, não guardando relação direta com o “rendimento escolar”, este sim objeto do Artigo supra. O que se vê, na prática, é um preocupante processo de “idiotização” do aluno, onde – ao contrário do que se deveria esperar (até pelo enorme custo que representa a escola, pública ou não) – é notória uma “involução”, retirando dele o pouco que lhe resta da infância, como a curiosidade e o prazer pela aprendizagem. Conseguimos tornar a escola algo pior e mais cruel do que a caixa de Pandora, deixando esvair a própria esperança e empurrando o mancebo, cada vez mais, para o fundo escuro e distorcido da caverna. Como forma de mascarar tamanho fracasso, não são poucas as instituições que criam e multiplicam “instrumentos avaliativos” (provinhas, trabalhinhos, recuperação, “recuperação da recuperação”...) que mal conseguem disfarçar o cheiro fétido que brota da ignorância. O resultado não poderia ser pior: alunos chegando ao término dos Ensinos Fundamental e Médio sem os requisitos mínimos necessários. O que se pretende, obviamente, não é retirar da escola seu caráter de socialização e troca de experiências, mas atribuir (restituir) a ela seu principal papel, o de ensinar, sob o risco – de não o fazendo – perder o próprio sentido de existir. A escola não deve ser confundida com a “esquina”, a casa ou o clube que, vale lembrar, também são espaços importantes para formação do sujeito. A “escola é escola”, assim como “professor é professor”, redundâncias importantes mas, ao que parece, esquecidas. Urge lutarmos por uma escola de qualidade, onde eventuais teorias (behaviorista, ausubeliana, vygotskyana, piagetiana,  freiriana, etc) não sejam um fim em si mesmas ou meras “armas” em favor ou desfavor de ideologias vazias (de “esquerda”, “direita”, “centro”...), mas referenciais teóricos capazes de contribuírem para o que mais se espera de uma escola: a aprendizagem!

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