AVALIAÇÃO: DESNUDANDO A INTENCIONALIDADE
Gilvan Teixeira
e-mail: profpreto@gmail.com
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br
A discussão em torno do Projeto Político-Pedagógico (PPP) e
Regimento da escola traz consigo, também, a necessidade de uma
profunda e oportuna reflexão acerca da “avaliação” na EJA
EAD-Semipresencial. Indiscutivelmente, nos últimos quatro anos,
melhoramos muito no que tange, por exemplo, ao percentual de alunos
aprovados. Tão ou mais importante do que isso – por ser condição
sine qua non para aprovação – foi conseguirmos diminuir,
significativamente, a evasão docente, a partir da implantação do
EAD-Semipresencial. Facilitamos o acesso e permanência do aluno ao
adotarmos um sistema híbrido de aulas presenciais e virtuais, onde o
educando precisa fazer-se presente apenas duas vezes por semana na
escola, podendo (e devendo!) complementar sua carga horária na
plataforma Moodle. Somado a isso, optamos por um horário de
aula presencial (das 20 às 22h30min.) que vem ao encontro,
principalmente, do aluno trabalhador e/ou chefe de família. Os
“números”, portanto, são bons. O grande desafio, agora, é
“qualificá-los”! Garantirmos ao educando a “qualidade”
daquilo que é ofertado, tornando a aprendizagem em algo realmente
significativo, capaz, por exemplo, de contribuir na sua formação
enquanto sujeito (cidadão), abrindo um maior leque de possibilidades
de inserção no mercado de trabalho e fornecendo os pré-requisitos
para que alce níveis mais elevados de escolarização. É nesse
contexto que deve ser inserida e compreendida a “avaliação”.
Trata-se não de algo pronto, estanque, rígido. Ao contrário, é um
“processo” contínuo, aberto, flexível. Serve a “avaliação”,
sobretudo, para que educador e educando possam analisar (avaliar) um
ao outro e autoanalisar-se (autoavaliar-se). É um “olhar” sobre
o “outro” (do professor frente ao aluno e vice-versa) e sobre si
mesmo. Avaliar não pode e não deve ser sinônimo de “açoitar”.
Objetiva-se, com ela (avaliação) auscultar a que ponto anda o
processo ensino-aprendizagem. Caminha-se na direção correta? A
metodologia é adequada? O que precisa ser revisto, modificado ou
reforçado? A avaliação, nem de perto, tem como objetivo principal
“aprovar” ou, menos ainda, “reprovar”. Até porque a
aprovação deveria ser decorrência natural do processo, enquanto a
reprovação uma anomalia, uma excrecência, verdadeira exceção.
Infelizmente, tem sido comum vermos a avaliação como se fosse um
fim em si mesmo. Desejamos, por vezes, que o aluno se “encaixe”
na avaliação, não percebendo que ao fazê-lo nos tornamos, nós
mesmos (educadores), escravos dos instrumentos que, em tese, deveriam
estar ao nosso serviço. Portanto, o foco da discussão não deve ser
se o aluno será ou não aprovado. Seria colocar a carroça à frente
dos bois. O cerne da discussão deve ser: como garantir que o
educando avance com qualidade? Quais serão as medidas a serem
tomadas pelo professor, serviços de apoio (SSE, SOE, LA, Biblioteca,
etc.), Direção, mantenedora, família e aluno para que a
aprendizagem aconteça? Somos todos responsáveis pelo processo.
Este, caso falhe, diz respeito a todos os envolvidos. Ao aluno com
dificuldade de aprendizagem, seja ofertada a maior e mais variada
gama possível de meios facilitadores (acompanhamento
individualizado, material concreto, currículo adaptado, etc.), não
para que “passe” (pois que não é o objetivo primeiro), mas para
que “aprenda”. Ao aluno descomprometido e/ou indisciplinado, seja
lançado sobre ele o olhar “viajante” do educador, buscando sua
inserção, de fato, no ambiente de aprendizagem, sem abrir mão da
exigência no que tange aos princípios de convivência e cumprimento
das necessárias regras sociais. A família deve ser tensionada a
participar, ativamente, do processo, sob o risco de, não o fazendo,
responder junto às instâncias existentes (Conselho Tutelar,
Ministério Público, Juizado da Infância e da Juventude, etc.).
A avaliação, quando da discussão e reelaboração dos documentos
escolares (PPP, Regimento, etc.), precisa ser tratada sob dois
grandes aspectos. O primeiro deles eu chamaria de “originário”,
associado à intencionalidade. Originário porque embasador não
apenas do segundo “aspecto” (associado à expressão formal dos
resultados obtidos pelo aluno: notas, conceitos, etc.), mas da
própria prática docente. Sob tal aspecto, originário, a avaliação
precisa casar com o projeto de cidadão, de escola, de sociedade e de
mundo que se vislumbra. Trata-se do principal aspecto da avaliação,
com profundas consequências e desdobramentos. Precisa estar claro
aos olhos de toda comunidade escolar. Cabe a esta definir e decidir,
por exemplo, qual é o “perfil” de aluno (cidadão) a ser
formado, sem olvidar, obviamente, das idiossincrasias existentes,
respeitando-se as diferenças e limitações. Objetiva-se com isso
não a “eugenização” social, mas um salutar e indispensável
“planejamento”, sem o qual seguirá rumando ao fracasso nosso
ensino. Deseja-se um cidadão autônomo ou autômato? Crítico ou
alienado? Responsável ou inconsequente? Trabalhador ou indolente?
Sadio ou não? Honesto ou ímprobo? Solidário ou narcisista? A
definição desse “perfil” deve nascer do diálogo entre o maior
e mais variado número de atores e, uma vez instituído, precisa
servir de norte à escola. O que vemos hoje, infelizmente, é uma
absoluta falta de planejamento, seja a curto, médio e,
principalmente, longo prazo. Sobram jargões completamente vazios,
por vezes dourados por posicionamentos político-ideológicos que
atendem a outros interesses que não o do educando.
O segundo aspecto da avaliação a ser considerado é o da
“expressão formal” dos resultados obtidos pelo aluno. Apesar de
“secundário” (menos importante do que o aspecto originário), é
o que mais aparece e, infelizmente, muito comumente acaba por ser
determinante na reprovação do educando. Apesar de ser apenas a
ínfima parte do iceberg, frequentemente faz naufragar sonhos,
alimentando a evasão e a multirrepetência. Faz lembrar o sôfrego e
caquético corpo, à beira da putrefação, incapaz de acompanhar a
potencialidade da alma (primeiro aspecto da avaliação). Portanto,
reduzir o aluno à nota (ou algo similar) é como encerrar a
complexidade da alma num corpo frágil e mortal. Todavia, ainda
assim, é inegável a importância (e dependência), especialmente
sob o ponto de vista operacional, das mensurações. Por vezes,
elege-se a adoção da “nota” como vilã do processo avaliativo.
Outras vezes, a bola da vez é o “conceito” ou outra forma de
expressão do rendimento escolar. Vã discussão, diga-se de
passagem. Faz diferença o invólucro do veneno? A cor da pílula é
capaz de mudar seus efeitos? Alguns parecem acreditar que sim. Adotam
formas aparentemente emancipatórias de avaliação, mas suas
práticas e olhar sobre o aluno seguem lógica diversa. Tais
mensurações são como lobo em pele de ovelha, portanto mais
perigosas e traiçoeiras do que a formas ditas tradicionais de
avaliar o educando. Conclui-se, assim, que todas as formas de
mensuração (ao menos, as mais usadas...) são, em essência, falhas
e insuficientes para abarcarem o aluno como um todo. Portanto, três
cuidados soam como necessários. O primeiro diz respeito à
consciência que deve ter o educador acerca da falibilidade das
mensurações propostas, por melhor que seja a intenção. O segundo
cuidado é quanto à necessidade de construirmos critérios
razoavelmente objetivos que sirvam de “espinha” dorsal no
processo avaliativo, critérios estes que – como vimos acima –
precisam estar de acordo com o desejo da comunidade escolar (formada
também, mas não somente, por professores...). Terceiro, último e
principal. O cuidado em fazer da “intencionalidade” (principal
aspecto da avaliação) o fio condutor de todo processo avaliativo.
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