O ESTADO CAFETÃO
Gilvan Teixeira
e-mail: profpreto@gmail.com
blog:
profgilvanteixeira.blogspot.com.br
Para que
serve, ou deveria servir, o Estado no mundo moderno? O Estado no Brasil há
muito tem se convertido num grande cafetão, onde a maioria de nós – populacho,
assalariados, servidores públicos mal pagos –, feito prostitutas, vemos nossos
corpos serem explorados e maltratados pela aspereza da vida. Como vis
mercadorias, somos lançados nos porões escuros e abjetos, até que a morte –
pois que, cada vez mais, a parca aposentadoria tarda em chegar... – usurpe o
último suspiro. Somos vilipendiados, abusados, extorquidos diuturnamente pelo
Estado. Enquanto este último se apropria dos vinténs, resta às marafonas as tristes
marcas do coito forçado. Sob o olhar indiferente e cúmplice do Judiciário, as
raparigas são enganadas e judiadas. Poderia ser diferente, uma vez que a toga é
garantidora de privilégios e deferências? Enquanto fede o prostíbulo, resultado
de uma história de descaso, a dita Casa do Povo vê desfilar parlamentares em
seus ternos alinhados, cercados de um exército de puxa-sacos que pouco mais
sabem do que balbuciarem algumas palavras e tremularem suas bandeirinhas em
período de campanha. Faltam às rameiras verdadeiros representantes. Como
cafetão, o Estado acredita ser dono de nossos corpos. É sustentado por nós, sem
nenhuma contrapartida, salvo algumas migalhas travestidas em hospitais,
escolas, estradas e presídios sucateados. Como cafetão, o Estado bebe e come às
custas do suor de “suas” vadias. Não satisfeito, sem parcimônia, usa da
brutalidade sempre que as putas resolvem protestar. Cassetete, gás lacrimogênio,
bala de borracha... Vez por outra, o algoz muda de estratégia. Usa a propaganda,
paga, ironicamente, pelas próprias vítimas. Tenta confundir o público, buscando
fazê-lo acreditar que “cidade” e “prostíbulo” são coisas distintas. O Estado,
no Brasil, definitivamente, não nos representa! Somos um país acéfalo, sem
verdadeira governança. O “Poder” não é público, mas atende a interesses
privados. Executivo, Legislativo e Judiciário não passam de redutos de
interesses espúrios e corporativos, tendo se tornado um fim em si mesmo. É a
“casa” balançar, sob as intempéries de uma famigerada e duvidosa “crise”, o
cafetão lança a culpa sobre as prostitutas. Usa de alguns jargões como se
fossem mágicos e capazes de reverterem a incompetência crônica. “Meritocracia”,
“gabinete popular”, “enxugamento da máquina”... Eufemismos a escamotearem a
perversa intenção de estourar a corda do lado mais frágil. Enquanto o Estado
cafetão se lambuza com seus privilégios e fartos manjares, perpetuados pela
promíscua troca de favores partidários, as prostitutas lutam contra a
desesperança e, muito comumente, se deixam levar pela lábia cafetina. Existem,
ainda, aquelas que, numa espécie de “síndrome de Estocolmo”, desenvolvem uma
doentia admiração pelo cafetão, deixando-se cooptar por um prato de lentilhas. Vadias,
uni-vos! Rompamos os atávicos grilhões que amordaçam nossos sonhos. Subvertamos
o status quo asqueroso que sustenta o
cafetão, enfraquecendo-o e levando-o à míngua. Tomemos o prostíbulo e façamos
dele um lugar limpo, justo e decente, onde todos sejam, de fato, iguais perante
a lei, togados ou não, letrados ou não, alinhados ou não. Construamos um
Estado, de fato, democrático, avesso a privilégios injustificados e intolerante
com toda espécie de larápio, ainda que sob a forma de um cafetão.
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