INDEPENDÊNCIA, PARA QUEM?
Prof. Gilvan
Teixeira
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blog:
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Cento e noventa e quatro anos! Sonho duradouro este,
não é mesmo? Quase dois séculos de história, desde a dita “independência” e
continuamos como que a sonhar. A ideia de um país verdadeiramente livre, justo
e solidário segue ainda no plano do discurso, vez por outra inflamado pela
disputa eleitoral. A prosperidade até que deu as caras por aqui, mas apenas
para uma minoria. Enquanto isso, a maioria de nossa gente – assim como os
escravos de outrora – segue à margem da boa qualidade de vida. Nossa pátria tem
sido “gentil” apenas para alguns poucos. Educação, saúde, segurança, assim como
a renda, têm faltado à maioria. A grandeza do território e a pujança do subsolo
contrastam com a esperança esfarrapada de nosso povo. Enormes clareiras,
impulsionadas pela ganância, vêm acabando com o verde da bandeira, enquanto o
amarelo tem sido surrupiado pela corrupção endêmica que contamina todas as
esferas do Poder. O azul, há horas sombreado pelas brumas do egoísmo, ostenta
não mais estrelas, mas pontas de baseados embebidas no cheiro nauseante saído
de cachimbos tomados de pedra que levam à morte. O que antes era branco, agora
é luto. Ouve-se, por toda parte, gritos de socorro. Mães desesperadas veem seus
rebentos serem tragados pelo tráfico e por toda sorte de violência. Para elas,
filhos. Para o Estado, números. Para elas, a tristeza e saudade eternas. Para o
Estado, estatísticas. O que vale a vida por estas terras? Um par de tênis, um
boné, um celular, um carro ou, quem sabe, um punhado de reais? Como bastardos,
não temos sido reconhecidos por este país. A Constituição, feito letra morta,
pouco mais serve do que carne putrefata aos vermes e abutres vestidos em suas
togas a pousarem em tribunais asseados e astronomicamente distantes da
realidade de quem os sustenta. É, o tempo passou e a real independência não
veio. Por que então comemorar? Há razões para fazê-lo? Sim e não são poucas. Muitos
são os que ainda teimam em crer no amanhã. Mais do que “crer”, levantam todo
dia dispostos a “agir”, transformando mera intenção em ação. Estudantes,
professores, serventes, porteiros, operários, empresários, médicos, advogados,
servidores públicos... Empregados, patrões, desempregados, aposentados,
pensionistas... Letrados, analfabetos, atletas, enfermos... Enfim, um universo
de crianças, jovens, homens e mulheres que teimam em fazer “seu melhor”. Não
titubeiam em optar pelo caminho da ética, da alteridade e da resiliência, esta
jamais confundida com subserviência. Amigos que são da verdade e da justiça,
enjeitam o dinheiro fácil e desonesto. Trilham o caminho da (auto)disciplina e do
interesse coletivo, sem perder de vista o respeito às diferenças, ainda que
incômodas. Não menor do que o Brasil, é o senso de justiça que brota em meio à
indiferença e desesperança. No interior das casas, escolas, fábricas,
hospitais, quarteis, igrejas e canteiros de obra pulsa uma esperança
propositiva, irrequieta, explosiva, capaz de subverter qualquer status quo, ainda que com aparência atávica.
Ora, que a fajuta independência registrada nos livros didáticos possa dar lugar
à verdadeira, a saber, uma independência construída no dia-a-dia, nas relações
de poder estabelecidas entre pais e filhos, homens e mulheres, governantes e
governados, professores e educandos. País independente é aquele que prima pelo
respeito à dignidade da pessoa humana, pela proteção e valorização da vida,
pela educação fundada na qualidade, pela aplicação impessoal da lei, pela
garantia de oportunidades iguais a todos, pela manutenção da ordem respaldada
na soberania popular e pela capacidade de manter acesa a tão necessária
esperança.