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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

ESCOLA, PARA QUÊ?


ESCOLA, PARA QUÊ?
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



        Foi-se o tempo de ver a escola como local de aprendizagem? Não o sendo, serve ela para quê? Sobram frases de efeito e jargões estéreis, talvez a esconderem a mais profunda incompetência e inabilidade de muitos que veem a carreira do magistério tão somente como um atalho à aposentadoria precoce. Há muito a qualidade de ensino foi abandonada, jogada às traças. Multiplica-se a burocracia, criam-se inúmeros conselhos, comissões, fóruns… Sobra “planejamento” (muitas vezes, não mais do que “retalhos” inacabados…), falta ação, fazendo lembrar o cuteleiro que diuturnamente, durante uma vida inteira, afia sua faca sem jamais usá-la. O resultado não poderia ser pior. São estarrecedores, embora não surpreendentes, os pífios resultados revelados pelo SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica – 2017). Cachoeirinha, por exemplo, segue a vergonhosa tendência nacional. No Município, tivemos 33,91% de alunos do 5º Ano do Ensino Fundamental com desempenho considerado “insuficiente” (0-3), 60,54% com desempenho considerado “básico” (4-6) e apenas 5,55% dos alunos com desempenho “avançado” (7-9). Já no 9º Ano do Fundamental, os números são, respectivamente, 70,14% (insuficiente), 28,99% (básico) e 0,88% (avançado). Verdadeiro caos! Quanto tempo, recursos e energia desperdiçados. Uma, duas, várias gerações vêm sendo perdidas, com imensuráveis prejuízos sociais e econômicos. O IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) não deixa dúvidas: caso exista uma luz ao final do túnel, estamos caminhando na direção oposta à ela! Conseguimos piorar o que já era terrível. No último ano do Fundamental, por exemplo, em 2015, a média do Município foi 4,4. Já em 2017, o número caiu para 4,2. Andamos para trás! No Rio Grande do Sul, o quadro não é menos grave. No ano passado (2017), o 9º Ano do Ensino Fundamental obteve a vexatória média de 4,4, enquanto a meta para o referido ano era 5,1. Nosso estado e Município conseguiram o que há alguns anos soava como impensável: estar aquém da média nacional nos índices que medem a qualidade da educação. No Brasil, em 2017, a média do 9º Ano no IDEB foi de 4,7. Definitivamente, educação neste país não é prioridade. Enquanto o dinheiro público escoa pelo ralo da corrupção e/ou e da incompetência dos gestores, seguimos enterrando sonhos e aumentando as levas de maltrapilhos intelectuais. Crianças, jovens e adultos destituídos da formação mínima necessária para alavancar o desenvolvimento. Gerações inteiras à beira da estupidez, da ignorância e de toda sorte de analfabetismo – inclusive o mais terrível de todos, o “político” -, verdadeiro húmus a alimentar as profundas desigualdades existentes. Qual é a saída para tamanha hecatombe? Inexistem respostas simples para problemas complexos. Todavia, já sabemos o que não funciona! Discursos intermináveis e vazios, por exemplo, são insuficientes para alcançar os objetivos desejados. Concepção pedagógica, implementação deste ou daquele “sistema”, adoção desta ou daquela “menção” avaliativa… Tudo será em vão se, lá na “ponta” (relação professor-aluno, relação ensino-aprendizagem), não ocorrer a verdadeira, urgente e necessária transformação. Urge buscarmos resultados efetivos, aparentes, que comprovem a aprendizagem. Optou-se, ao longo dos últimos anos, pelo discurso que beira a imbecilidade, onde as avaliações externas (como o SAEB) foram demonizadas, taxadas de retrógradas, como se estivessem a serviço do “capital”. Por quê? Desconhecimento, talvez. Quem sabe, temor em revelar as próprias contradições? O fato é que a repulsa às avaliações externas inibiram ações oportunas, impediram ou, no mínimo, prejudicaram iniciativas capazes de evitarem a que chegássemos onde chegamos: no fundo do poço. Apesar dos números saídos de tais instrumentos serem incapazes de “falarem” por si mesmos ou de encerrarem “toda” verdade, ainda assim são fundamentais, pois que “indicadores” do que está ou não dando certo. O ensino (público e privado) precisa ser rediscutido, urgentemente. Estamos menosprezando e aniquilando a capacidade criativa, reflexiva, propositiva, empreendedora de nossos educandos. O que se vê, é a mais absoluta falta de uma política de Estado voltada à qualificação do ensino. Pouco avançou-se, por exemplo, na valorização dos profissionais da educação. Seguem mal pagos e mal preparados, socialmente desprestigiados e, por vezes, à mercê de entidades classistas que – apesar do surrado discurso amigável – reproduzem as mesmas mazelas que condenam. As escolas por sua vez, especialmente as públicas, convivem por exemplo, salvo raríssimas exceções, com prédios e equipamentos sucateados, escassez ou inexistência de espaços para prática de esportes, falta de professores, insegurança de toda ordem, falta ou precariedade da merenda, currículos falhos e distanciamento da família. Temos hoje um flagrante e pérfido círculo vicioso do fracasso escolar: legislação equivocada, investimento público insuficiente, precariedade da escola, professor mal pago e mal preparado, distanciamento da família, aluno descomprometido, fracasso total do ensino. Podemos mudar a ordem, substituir ou agregar expressões, mas o resultado será o mesmo: colapso total do ensino.
        A solução passa pela quebra do “círculo” acima e para fazê-lo – assim como para se fazer uma omelete há de se quebrar os ovos – precisamos romper com inúmeras práticas, ranços e vícios arraigados à “cultura” existente. O que compete a cada um? “A César o que é de César, ...”. A primeira medida é identificar as competências, afinal trata-se de um concatenamento de ações. Falhando um, compromete-se – às vezes mais, às vezes menos – o todo. A legislação precisa ser revista. A escola pública (ante à falta de recursos e o aumento das demandas) precisa ser abraçada também pela iniciativa privada, por meio de parcerias, incentivos fiscais, tendo como pano de fundo, sempre!, o interesse público. Infelizmente, hoje, o que se vê é uma burocracia insana que desmotiva qualquer iniciativa voltada às parcerias entre os entes público e privado, como se não fizessem parte da mesma moeda. Somado a isso, o Poder Público precisa não apenas aumentar os investimentos, mas (e, sobretudo!) otimizá-los, focar em resultados, principalmente naqueles que atestem a boa qualidade do ensino ofertado. O que se espera do atendimento à criança da Educação Infantil? O que se espera de um aluno ao término do Ensino Fundamental e/ou do Ensino Médio? Uma vez não atendida à expectativa, o Estado precisa interferir, buscando os porquês e trabalhando no sentido de sanar os problemas verificados. Para tanto, a Escola precisa se remodelar (pois o que se vê hoje é a verdadeira “casa da mãe Joana”, onde confunde-se “autonomia” com “independência”) e também trabalhar focada em “resultados” (não com o cunho mercadológico, mas social), onde o verdadeiro sentido do “planejamento”, “operacionalização” e “avaliação” deverá ser resgatado. Para isso, o professor deverá ser, primeiro, valorizado, mas também cobrado para que, efetivamente, cumpra seu papel. Deverá estar sob permanente (auto)avaliação, precisando corresponder aos investimentos realizados (formação, Progressão de Nível, Promoção por Merecimento, etc.). Na Escola pública, nós professores somos SERVIDORES, portanto temos a obrigação não apenas ética e moral, mas jurídica, de devolvermos à coletividade o investimento que esta faz em nós! A Escola não é um feudo. Tem ela uma função social a cumprir e ao não fazê-lo perde o sentido da própria existência. A família, por sua vez, também precisa ser chamada à responsabilidade. A presença dela não pode ficar restrita à entrega dos “boletins” ou às “festinhas”. Precisa ser chamada à responsabilidade – da mesma forma que a Escola – por eventual fracasso do aluno, sua infrequência, indisciplina, etc.. A comunidade escolar, como um todo, deve sentir-se envolvida e comprometida com o processo ensino-aprendizagem. O Conselho Escolar, por exemplo, necessita deixar de ser uma instância meramente formal. Precisa, assim como o CPM e o Grêmio Estudantil, existir de fato, exercendo aquelas atribuições previstas no ordenamento. O educando (ah, o aluno…) deve ser o “protagonista” em todo esse processo. Trata-se, portanto, de ônus e bônus. O mesmo aluno que deve ser “protegido” em seu direito (ver Constituição Federal, ECA, LDB, etc.), pois que sujeito em formação, deve, também, ser “exigido” quanto às obrigações que lhe dizem respeito, respeitada, é claro, a capacidade de compreensão decorrente da idade e/ou outras peculiaridades. Precisamos romper com a cultura do “coitadismo” e “vitimização”, onde prejudica-se a formação integral do educando, nivelando-o “por baixo”, como se fosse incapaz de alçar patamares mais elevados. Utiliza-se de “concepções” pedagógicas comprovadamente fracassadas em nome de uma pretensa “educação libertadora”, mas que na prática embota o conhecimento, emburrece e embrutece o sujeito e fulmina toda e qualquer esperança numa sociedade melhor e mais justa, condição esta só possível mediante um ensino de qualidade.

2 comentários:

  1. Grande crítica professor, a educação no Brasil esta realmente precária e a luz no fim do túnel vem se tornando cada vez mais difusa. Abraços.

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  2. Agradeço pelo comentário. Infelizmente, num quadro de dor como o que vivemos, a "luz" no final do túnel, cada vez mais "difusa", como disseste, tende a sumir. Ainda assim, é nosso papel enquanto educador, pai, gestor, seguir lutando e tensionando para que a situação melhore e a educação deixe a UTI. Abraço fraterno.

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