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quinta-feira, 27 de setembro de 2018

RESUMO DAS AULAS DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA - EJA UNIVERSITÁRIO

FILOSOFIA
Prof. Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                A doutrina “individualista” acerca da sociedade parte da ideia de que a vontade individual deve prevalecer sobre o interesse coletivo. Tal doutrina embasou importantes movimentos, como o do Liberalismo Econômico do século XVIII, movimento este que combatia a intervenção do Estado na economia. Já a doutrina “coletivista” parte do pressuposto da prevalência do interesse coletivo sobre o individual, tendo embasado movimentos não menos importantes, como o socialismo marxista. Percebe-se que ambas as doutrinas apresentam aspectos positivos e negativos. A “individualista”, por um lado, valoriza os direitos e liberdades individuais, buscando proteger o sujeito frente aos abusos praticados pelo Estado em nome de um pretenso interesse social. Por outro lado, tal doutrina, por vezes, leva ao narcisismo doentio, onde a vontade de um – ainda que em prejuízo de todos os demais – é resguardada. Já a doutrina “coletivista” apresenta como um de seus aspectos positivos a valorização do grupo, da sociedade como um todo, mas, por outro lado, pode servir de álibi para o Estado ferir direitos individuais de grande valor. Infelizmente, a história do Brasil está recheada de exemplos associados ao abuso de poder estatal, onde muito comumente o cidadão é “esfolado” pelo mesmo Poder Público que deveria ser o garantidor de saúde, segurança e educação de qualidade, por exemplo. Por aqui, é comum vermos uma perigosa, vergonhosa e preocupante confusão entre “público” e “privado”, em prejuízo da maioria da população. O Estado acabou por tornar-se um fim em si mesmo, criando e reforçando privilégios para alguns poucos. Outro tema por nós trabalhado nas aulas de Filosofia diz respeito à forma de vermos a cultura. Durante muito tempo prevaleceu um olhar “evolucionista” sobre a mesma, olhar este responsável por inúmeras atrocidades em relação a diversos povos. Segundo tal ponto de vista, existe uma hierarquia entre culturas, algumas delas melhores e superiores a outras. Foi (e continua sendo!) com base nessa ótica que, por exemplo, os europeus exploraram, catequizaram e dizimaram muitos dos povos pré-colombianos que viviam na América. Já o ponto de vista da Antropologia Moderna, mais atual e equilibrada do que a anterior, parte da ideia de que todas as culturas são importantes e devem ser respeitadas, pois é a diferença cultural que enriquece as relações e engrandece a humanidade. Finalmente, tratamos do tema “ética e cidadania”, onde procuramos mostrar que a primeira está marcada pela universalidade e atemporalidade, diferentemente da “moral” (espacial e temporal). Já a cidadania, por sua vez, pressupõe conhecimento dos direitos (e deveres, é claro) e exercício dos mesmos. Portanto, estamos longe de sermos um país de cidadãos, pois a maioria de nossa gente segue à margem da educação, esta a principal via para o real desenvolvimento de um povo.


SOCIOLOGIA


                Quando analisamos a Terra, podemos fazê-lo de duas formas. Uma delas com foco nos aspectos físicos (naturais), onde temos os continentes. Trata-se da forma mais simples de dividir o planeta, pois tem se mostrado pouco flexível. Afinal, há milhões de anos, temos os continentes, quase da mesma forma como os conhecemos hoje. Outra forma de analisarmos a Terra é a partir de critérios socioeconômicos, esta sim muito mais complexa, pois muda com certa frequência. Sob esta ótica, temos o Norte (conjunto de países desenvolvidos) e o Sul (conjunto de países subdesenvolvidos). Mas o que é um e outro? A principal característica de ambos diz respeito à qualidade de vida da população. Assim, enquanto no Norte, a maioria da população vive bem (saúde, educação, segurança, transporte, saneamento, etc.), no Sul, ao contrário, a maioria vive mal. É o caso do Brasil, um país que apesar de rico é subdesenvolvido, pois a maioria de nossos irmãos segue convivendo com a fome, desemprego, falta de saneamento, educação inexistente ou precária, saúde colapsada, etc. Nosso país está marcado pela violência e descaso do Estado, cleptocracia e confusão entre o público e o privado. Cria-se um “círculo vicioso de pobreza”, círculo este difícil de ser rompido, pois o principal “antídoto”, a educação de qualidade, não recebe a atenção merecida e necessária. O Brasil insere-se no rol dos países mais desiguais do mundo, onde apenas uma minoria tem acesso a uma vida digna e aos melhores recursos do mundo moderno. Nas aulas também tratamos acerca do “trabalho no Brasil”. Vimos que durante um longo período histórico (Colônia e Império), a escravidão foi a principal, apesar de vil, força produtiva, escravidão esta que recaiu sobre os índios e negros. Sob o olhar quase sempre omisso e conivente da Igreja, levas e mais levas de homens e mulheres de todas as idades e origens (bantos, sudaneses, etc.) foram explorados, comprados, vendidos, alugados, mutilados e mortos. Tratava-se de um comércio tão cruel, quanto lucrativo. Somente a partir de meados do século XIX, pressionado pela Inglaterra e por leis como a Eusébio de Queiroz, é que o fluxo de escravos para o Brasil começou a declinar, declínio este também associado às chamadas “leis abolicionistas” (Sexagenário, Ventre Livre, etc.) que antecederam a conhecida Lei Áurea (1888) que decretou o fim oficial da escravidão no país. Contudo, sabemos, a situação dos negros – numericamente, os mais visados pela escravidão – seguiu marcada pela discriminação e maior dificuldade de acesso à educação, trabalho, saúde, etc.. A prática da escravidão hoje, apesar de ilegal, persiste, especialmente nas áreas mais afastadas do país. Crianças, jovens, adultos e idosos, homens e mulheres de todas as etnias convivem em condições subumanas. O advento da CLT, Consolidação das Leis Trabalhistas, em 1943, durante o governo Vargas, foi um importante marco na melhoria das condições de trabalho, pois trouxe segurança jurídica aos trabalhadores, em especial aos do chamado “mercado formal” (com carteira assinada). Muitos dos benefícios e garantias hoje conhecidas (férias, décimo-terceiro, repouso remunerado, multa por demissão sem justa causa, etc.) advêm daquele período. A dita “flexibilização” das leis trabalhistas, referendada já neste século, nasceu sob o argumento de que tantas “vantagens” e “garantias” ao trabalhador acabavam por onerar demasiadamente a folha de pagamento das empresas. Apesar da enorme resistência dos sindicatos de trabalhadores, a reforma trabalhista foi aprovada e somente o tempo será capaz de dizer o acerto ou não da medida. Quanto ao trabalho da mulher, outro assunto por nós abordado, houve profunda mudança ao longo da história do Brasil. Outrora, até meados do século XX, à mulher era reservado o papel de mãe e dona-de-casa. Somente a partir da década de 1970 – com o fortalecimento do movimento feminista e o avanço da industrialização – o trabalho feminino tomou impulso. Apesar dos avanços, os dados não deixam dúvida: a mulher segue discriminada no mercado de trabalho, discriminação esta revelada, sobretudo, na diferença salarial comparado ao trabalho masculino. Finalmente, tratamos, ainda, do tema “ética e cidadania”, onde vimos que a primeira diz respeito ao conjunto de valores universais e atemporais, diferentemente da “moral” (espacial e temporal). Já a cidadania, reforçamos em nossas aulas, pressupõe conhecimento e exercício de direitos, daí a certeza de que vivemos num país de “não-cidadãos”, de “analfabetos políticos”, marca esta herdada do período da colonização e reforçada, ainda hoje, por relações de poder espúrias, coronelistas, que acabam por legitimar e perpetuar privilégios de alguns poucos em detrimento da maioria. 

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

LUGAR DE ALUNO É NA ESCOLA


LUGAR DE ALUNO É NA ESCOLA
Prof. Gilvana Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


     A Constituição Federal, em seu início, traz:
 Art. 1º A República Federativa do Brasil, [...] constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
 II - a cidadania;
 III - a dignidade da pessoa humana;
 […]




     É sabido o papel que a escola tem, seja na construção da cidadania, seja na defesa e promoção da dignidade da pessoa humana. Para tanto, há de se garantir o acesso e permanência do educando aos bancos escolares. A Carta diz, ainda:
Art. 6º São direitos sociais a educação1, [...], na forma desta Constituição.

     Ou ainda:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
[…]

     Trata-se a escola, como se vê, de um lugar privilegiado na construção não apenas do saber formal, mas também na formação da cidadania. O educando – especialmente crianças e adolescentes – precisa ser entendido como alguém em processo de desenvolvimento. A Lei das Diretrizes e Bases da Educação (LDB, Lei Federal nº 9394 de 1996) segue nesse diapasão:
Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho2.
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;


     Ora, se o educando fosse um sujeito “pronto” (inclusive sob o ponto de vista comportamental), qual seria a razão de ser da escola3? Não por acaso, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA- Lei Federal nº 8069 de 1990), veio enfatizar a necessidade (obrigatoriedade) de um olhar diferenciado à criança e adolescente.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
[…]


     Repara-se na expressão “todas as oportunidades e facilidades” voltadas ao desenvolvimento, inclusive, “moral” do educando. Assim, atos de indisciplina, por exemplo, devem – salvo casos muito graves, que configurem atos infracionais – servir de matéria-prima para formação do sujeito, não para sua exclusão da escola. É reparável o dano causado pelo aluno? Que assim se faça4, tendo o cuidado para jamais fugir ao previsto nos documentos oficiais da escola (PPP5, Regimento, Estatuto Disciplinar, etc.) e na legislação.


     Diz o ECA:
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.


     Portanto, sair em defesa do direito do educando, nem de perto pode ser confundido com aquiescência ou conivência frente à indisciplina escolar. Como não pode, também, o ECA ser visto como “escudo” voltado à permissividade irresponsável e inconsequente6. Ora, o que se pretende, isso sim, é proteger a “pessoa” (sujeito), não o ato por ela praticado. O ECA lembra:
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.


     Percebe-se, claramente, a intenção do legislador em enfatizar que o interesse coletivo (consubstanciado nas regras, inclusive escolares), bem como a “equação” entre direitos e deveres devem ser preservados, mas sempre (obrigatoriamente!) levando-se em conta a “condição peculiar” (alguém em franco processo de formação) do educando. Vale lembrar, ainda, que a dita “indisciplina escolar”, quase sempre, é fruto de um leque de fatores: incompetência dos pais em estabelecerem e exigirem limites, inexistência ou fragilidade das regras de convivência dentro da escola, incoerência dos professores (exigem o que não fazem), precariedade no atendimento em “rede” face à indisciplina (professor – pais – SOE – profissionais da saúde – Direção – Conselho Escolar – Conselho Tutelar – Ministério Público – Juizado da Infância e da Juventude, etc.), “liquidez” cultural (Bauman), relativismo doentio, frouxidão na aplicação da lei, dentre outros, sem esquecer, é claro, a (ir)responsabilidade do próprio aluno. Sendo, portanto, a indisciplina escolar um assunto de tamanha complexidade, tratá-la de forma simplista soa como pouco inteligente, temerário e imprudente. Aplicar medidas equivocadas é tão perigoso quanto não aplicá-las, aumentando o risco de termos efeitos colaterais indesejados, como a reincidência, agudização do problema, retroalimentação do ciclo vicioso da violência e indisciplina escolares, judicialização da relação professor-aluno ou escola-família, etc.. Ninguém ganha, todos perdem!

     Não se trata, assim, de vedar os olhos ante à indisciplina escolar, mas de buscar alternativas e saídas que promovam o fortalecimento de valores (solidariedade, respeito, honestidade, ética, comprometimento, etc.) e uma maior robustez da teia social. Vale lembrar que previsão legal para eventuais “sanções” frente à quebra de regras sociais, por parte de adolescentes, já existe. Maior exemplo disso é o próprio ECA (acusado de “permissivo” pelos leigos no assunto…), ao trazer as chamadas “medidas socieducativas”, aplicáveis quando da prática de atos infracionais:
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.


     Diz, ainda:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semiliberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.
[…]


     Vale lembrar que a “conotação” dada às medidas, aplicáveis aos que estão sob a proteção do ECA, tem cunho pedagógico e não punitivo:
Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
Parágrafo único.  São também princípios que regem a aplicação das medidas:    
[...]    
II - proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares;     
[...]
 IV - interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;  
 V - privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; 
 VI - intervenção precoce: a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida;   
VII - intervenção mínima: a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do adolescente;      
VIII - proporcionalidade e atualidade: a intervenção deve ser a necessária e adequada à situação de perigo em que a criança ou o adolescente se encontram no momento em que a decisão é tomada;         
IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente;       
[...]
XI - obrigatoriedade da informação: a criança e o adolescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, seus pais ou responsável devem ser informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa;  
[...]

     A “expulsão” (numa linguagem mais eufemista, “transferência compulsória”) - ou mesmo a “suspensão” - de um aluno precisa ser analisada com muita cautela. É possível, sob o ponto de vista legal? Apesar das controvérsias, parece que sim, até porque são inúmeros os casos em que tiveram (expulsão e suspensão) a chancela do Judiciário. Contudo, apesar de “possível”, não é – salvo raríssimas exceções – recomendável. Ainda que grave o ato praticado pelo aluno (adolescente), a ponto de configurar um “ato infracional”, cabe à escola analisar aspectos como: gravidade do ato, consequências, circunstâncias (por que, como ocorreu?), reincidência (o aluno transgressor tem registros anteriores? quais? quando? combinações que foram feitas? medidas que foram tomadas?). Feito isso, a escola precisa chamar as partes envolvidas e, se possível, criar um “canal” pautado no diálogo (ver Círculos Restaurativos!) e resolução conciliatória de conflitos. Deve-se garantir ao “acusado” a ampla defesa e o contraditório, devidamente registrado e assinado (sendo aluno menor, com a presença do responsável). O pano de fundo de todos esses “movimentos” feitos pela instituição deve ser a formação do educando, de maneira a que cresça enquanto cidadão e partícipe da sociedade, aprendendo a respeitar (a si e ao “outro”) e a conviver. A “suspensão” - muito mais ainda, a “expulsão” - deve ser vista como medida extrema e atestatória da incapacidade da sociedade (aluno, família, escola, Estado) em resolver suas contradições. Caso a escola insista na aplicação de tais medidas, deverá, ainda, estar respaldada nos seus próprios documentos norteadores, como a PPP, Regimento e Estatuto Disciplinar, sob o risco de não o fazendo ser responsabilizada e ter que voltar atrás em sua decisão.




1Todos os grifos são meus.
2Comparar com o Art. 53 da Lei Federal nº 8069/1990 – ECA).
3O Parecer CNE/CP nº 8/2012, diz:
[…] o conflito no ambiente educacional é pedagógico uma vez que por meio dele podem ser discutidos diferentes interesses, sendo possível, com isso, firmar acordos pautados pelo respeito e promoção aos Direitos Humanos. Além disso, a função pedagógica da mediação permite que os sujeitos em conflito possam lidar com suas divergências de forma autônoma, pacífica e solidária, por intermédio de um diálogo capaz de empoderá-los para a participação ativa na vida em comum, orientada por valores baseados na solidariedade, justiça e igualdade.
4O Parecer CEED/RS nº 282/2015 traz: “Nesse contexto, se defende a sanção por reciprocidade que está diretamente relacionada com a falta praticada, ensinando o respeito às regras, que são construídas de forma participativa e de conhecimento do grupo, estando ancoradas em propósitos de cooperação e igualdade”.
5Proposta Político-Pedagógica.
6Não apenas o ECA traz, implicitamente, obrigações aos “menores”. O Código Civil Brasileiro (Lei Federal nº 10.406/2002), ao tratar sobre o exercício do poder familiar, diz:
Art. 1.634.  Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos
[…]
IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.  
Resta claro, como se vê no dispositivo acima, que, primeiro, o ordenamento jurídico brasileiro não é “permissivo”, mas isto sim, desconhecido e/ou mal aplicado. Segundo, que o papel de “autoridade” (dos pais, professores, etc.) vai muito além de uma mera (mas importante) previsão legal, necessita ser construído e mantido por meio de posturas e ações coerentes com a função.

ESCOLA, PARA QUÊ?


ESCOLA, PARA QUÊ?
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



        Foi-se o tempo de ver a escola como local de aprendizagem? Não o sendo, serve ela para quê? Sobram frases de efeito e jargões estéreis, talvez a esconderem a mais profunda incompetência e inabilidade de muitos que veem a carreira do magistério tão somente como um atalho à aposentadoria precoce. Há muito a qualidade de ensino foi abandonada, jogada às traças. Multiplica-se a burocracia, criam-se inúmeros conselhos, comissões, fóruns… Sobra “planejamento” (muitas vezes, não mais do que “retalhos” inacabados…), falta ação, fazendo lembrar o cuteleiro que diuturnamente, durante uma vida inteira, afia sua faca sem jamais usá-la. O resultado não poderia ser pior. São estarrecedores, embora não surpreendentes, os pífios resultados revelados pelo SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica – 2017). Cachoeirinha, por exemplo, segue a vergonhosa tendência nacional. No Município, tivemos 33,91% de alunos do 5º Ano do Ensino Fundamental com desempenho considerado “insuficiente” (0-3), 60,54% com desempenho considerado “básico” (4-6) e apenas 5,55% dos alunos com desempenho “avançado” (7-9). Já no 9º Ano do Fundamental, os números são, respectivamente, 70,14% (insuficiente), 28,99% (básico) e 0,88% (avançado). Verdadeiro caos! Quanto tempo, recursos e energia desperdiçados. Uma, duas, várias gerações vêm sendo perdidas, com imensuráveis prejuízos sociais e econômicos. O IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) não deixa dúvidas: caso exista uma luz ao final do túnel, estamos caminhando na direção oposta à ela! Conseguimos piorar o que já era terrível. No último ano do Fundamental, por exemplo, em 2015, a média do Município foi 4,4. Já em 2017, o número caiu para 4,2. Andamos para trás! No Rio Grande do Sul, o quadro não é menos grave. No ano passado (2017), o 9º Ano do Ensino Fundamental obteve a vexatória média de 4,4, enquanto a meta para o referido ano era 5,1. Nosso estado e Município conseguiram o que há alguns anos soava como impensável: estar aquém da média nacional nos índices que medem a qualidade da educação. No Brasil, em 2017, a média do 9º Ano no IDEB foi de 4,7. Definitivamente, educação neste país não é prioridade. Enquanto o dinheiro público escoa pelo ralo da corrupção e/ou e da incompetência dos gestores, seguimos enterrando sonhos e aumentando as levas de maltrapilhos intelectuais. Crianças, jovens e adultos destituídos da formação mínima necessária para alavancar o desenvolvimento. Gerações inteiras à beira da estupidez, da ignorância e de toda sorte de analfabetismo – inclusive o mais terrível de todos, o “político” -, verdadeiro húmus a alimentar as profundas desigualdades existentes. Qual é a saída para tamanha hecatombe? Inexistem respostas simples para problemas complexos. Todavia, já sabemos o que não funciona! Discursos intermináveis e vazios, por exemplo, são insuficientes para alcançar os objetivos desejados. Concepção pedagógica, implementação deste ou daquele “sistema”, adoção desta ou daquela “menção” avaliativa… Tudo será em vão se, lá na “ponta” (relação professor-aluno, relação ensino-aprendizagem), não ocorrer a verdadeira, urgente e necessária transformação. Urge buscarmos resultados efetivos, aparentes, que comprovem a aprendizagem. Optou-se, ao longo dos últimos anos, pelo discurso que beira a imbecilidade, onde as avaliações externas (como o SAEB) foram demonizadas, taxadas de retrógradas, como se estivessem a serviço do “capital”. Por quê? Desconhecimento, talvez. Quem sabe, temor em revelar as próprias contradições? O fato é que a repulsa às avaliações externas inibiram ações oportunas, impediram ou, no mínimo, prejudicaram iniciativas capazes de evitarem a que chegássemos onde chegamos: no fundo do poço. Apesar dos números saídos de tais instrumentos serem incapazes de “falarem” por si mesmos ou de encerrarem “toda” verdade, ainda assim são fundamentais, pois que “indicadores” do que está ou não dando certo. O ensino (público e privado) precisa ser rediscutido, urgentemente. Estamos menosprezando e aniquilando a capacidade criativa, reflexiva, propositiva, empreendedora de nossos educandos. O que se vê, é a mais absoluta falta de uma política de Estado voltada à qualificação do ensino. Pouco avançou-se, por exemplo, na valorização dos profissionais da educação. Seguem mal pagos e mal preparados, socialmente desprestigiados e, por vezes, à mercê de entidades classistas que – apesar do surrado discurso amigável – reproduzem as mesmas mazelas que condenam. As escolas por sua vez, especialmente as públicas, convivem por exemplo, salvo raríssimas exceções, com prédios e equipamentos sucateados, escassez ou inexistência de espaços para prática de esportes, falta de professores, insegurança de toda ordem, falta ou precariedade da merenda, currículos falhos e distanciamento da família. Temos hoje um flagrante e pérfido círculo vicioso do fracasso escolar: legislação equivocada, investimento público insuficiente, precariedade da escola, professor mal pago e mal preparado, distanciamento da família, aluno descomprometido, fracasso total do ensino. Podemos mudar a ordem, substituir ou agregar expressões, mas o resultado será o mesmo: colapso total do ensino.
        A solução passa pela quebra do “círculo” acima e para fazê-lo – assim como para se fazer uma omelete há de se quebrar os ovos – precisamos romper com inúmeras práticas, ranços e vícios arraigados à “cultura” existente. O que compete a cada um? “A César o que é de César, ...”. A primeira medida é identificar as competências, afinal trata-se de um concatenamento de ações. Falhando um, compromete-se – às vezes mais, às vezes menos – o todo. A legislação precisa ser revista. A escola pública (ante à falta de recursos e o aumento das demandas) precisa ser abraçada também pela iniciativa privada, por meio de parcerias, incentivos fiscais, tendo como pano de fundo, sempre!, o interesse público. Infelizmente, hoje, o que se vê é uma burocracia insana que desmotiva qualquer iniciativa voltada às parcerias entre os entes público e privado, como se não fizessem parte da mesma moeda. Somado a isso, o Poder Público precisa não apenas aumentar os investimentos, mas (e, sobretudo!) otimizá-los, focar em resultados, principalmente naqueles que atestem a boa qualidade do ensino ofertado. O que se espera do atendimento à criança da Educação Infantil? O que se espera de um aluno ao término do Ensino Fundamental e/ou do Ensino Médio? Uma vez não atendida à expectativa, o Estado precisa interferir, buscando os porquês e trabalhando no sentido de sanar os problemas verificados. Para tanto, a Escola precisa se remodelar (pois o que se vê hoje é a verdadeira “casa da mãe Joana”, onde confunde-se “autonomia” com “independência”) e também trabalhar focada em “resultados” (não com o cunho mercadológico, mas social), onde o verdadeiro sentido do “planejamento”, “operacionalização” e “avaliação” deverá ser resgatado. Para isso, o professor deverá ser, primeiro, valorizado, mas também cobrado para que, efetivamente, cumpra seu papel. Deverá estar sob permanente (auto)avaliação, precisando corresponder aos investimentos realizados (formação, Progressão de Nível, Promoção por Merecimento, etc.). Na Escola pública, nós professores somos SERVIDORES, portanto temos a obrigação não apenas ética e moral, mas jurídica, de devolvermos à coletividade o investimento que esta faz em nós! A Escola não é um feudo. Tem ela uma função social a cumprir e ao não fazê-lo perde o sentido da própria existência. A família, por sua vez, também precisa ser chamada à responsabilidade. A presença dela não pode ficar restrita à entrega dos “boletins” ou às “festinhas”. Precisa ser chamada à responsabilidade – da mesma forma que a Escola – por eventual fracasso do aluno, sua infrequência, indisciplina, etc.. A comunidade escolar, como um todo, deve sentir-se envolvida e comprometida com o processo ensino-aprendizagem. O Conselho Escolar, por exemplo, necessita deixar de ser uma instância meramente formal. Precisa, assim como o CPM e o Grêmio Estudantil, existir de fato, exercendo aquelas atribuições previstas no ordenamento. O educando (ah, o aluno…) deve ser o “protagonista” em todo esse processo. Trata-se, portanto, de ônus e bônus. O mesmo aluno que deve ser “protegido” em seu direito (ver Constituição Federal, ECA, LDB, etc.), pois que sujeito em formação, deve, também, ser “exigido” quanto às obrigações que lhe dizem respeito, respeitada, é claro, a capacidade de compreensão decorrente da idade e/ou outras peculiaridades. Precisamos romper com a cultura do “coitadismo” e “vitimização”, onde prejudica-se a formação integral do educando, nivelando-o “por baixo”, como se fosse incapaz de alçar patamares mais elevados. Utiliza-se de “concepções” pedagógicas comprovadamente fracassadas em nome de uma pretensa “educação libertadora”, mas que na prática embota o conhecimento, emburrece e embrutece o sujeito e fulmina toda e qualquer esperança numa sociedade melhor e mais justa, condição esta só possível mediante um ensino de qualidade.