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sábado, 4 de março de 2017

O ESTADO CAFETÃO


O ESTADO CAFETÃO
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


Para que serve, ou deveria servir, o Estado no mundo moderno? O Estado no Brasil há muito tem se convertido num grande cafetão, onde a maioria de nós – populacho, assalariados, servidores públicos mal pagos –, feito prostitutas, vemos nossos corpos serem explorados e maltratados pela aspereza da vida. Como vis mercadorias, somos lançados nos porões escuros e abjetos, até que a morte – pois que, cada vez mais, a parca aposentadoria tarda em chegar... – usurpe o último suspiro. Somos vilipendiados, abusados, extorquidos diuturnamente pelo Estado. Enquanto este último se apropria dos vinténs, resta às marafonas as tristes marcas do coito forçado. Sob o olhar indiferente e cúmplice do Judiciário, as raparigas são enganadas e judiadas. Poderia ser diferente, uma vez que a toga é garantidora de privilégios e deferências? Enquanto fede o prostíbulo, resultado de uma história de descaso, a dita Casa do Povo vê desfilar parlamentares em seus ternos alinhados, cercados de um exército de puxa-sacos que pouco mais sabem do que balbuciarem algumas palavras e tremularem suas bandeirinhas em período de campanha. Faltam às rameiras verdadeiros representantes. Como cafetão, o Estado acredita ser dono de nossos corpos. É sustentado por nós, sem nenhuma contrapartida, salvo algumas migalhas travestidas em hospitais, escolas, estradas e presídios sucateados. Como cafetão, o Estado bebe e come às custas do suor de “suas” vadias. Não satisfeito, sem parcimônia, usa da brutalidade sempre que as putas resolvem protestar. Cassetete, gás lacrimogênio, bala de borracha... Vez por outra, o algoz muda de estratégia. Usa a propaganda, paga, ironicamente, pelas próprias vítimas. Tenta confundir o público, buscando fazê-lo acreditar que “cidade” e “prostíbulo” são coisas distintas. O Estado, no Brasil, definitivamente, não nos representa! Somos um país acéfalo, sem verdadeira governança. O “Poder” não é público, mas atende a interesses privados. Executivo, Legislativo e Judiciário não passam de redutos de interesses espúrios e corporativos, tendo se tornado um fim em si mesmo. É a “casa” balançar, sob as intempéries de uma famigerada e duvidosa “crise”, o cafetão lança a culpa sobre as prostitutas. Usa de alguns jargões como se fossem mágicos e capazes de reverterem a incompetência crônica. “Meritocracia”, “gabinete popular”, “enxugamento da máquina”... Eufemismos a escamotearem a perversa intenção de estourar a corda do lado mais frágil. Enquanto o Estado cafetão se lambuza com seus privilégios e fartos manjares, perpetuados pela promíscua troca de favores partidários, as prostitutas lutam contra a desesperança e, muito comumente, se deixam levar pela lábia cafetina. Existem, ainda, aquelas que, numa espécie de “síndrome de Estocolmo”, desenvolvem uma doentia admiração pelo cafetão, deixando-se cooptar por um prato de lentilhas. Vadias, uni-vos! Rompamos os atávicos grilhões que amordaçam nossos sonhos. Subvertamos o status quo asqueroso que sustenta o cafetão, enfraquecendo-o e levando-o à míngua. Tomemos o prostíbulo e façamos dele um lugar limpo, justo e decente, onde todos sejam, de fato, iguais perante a lei, togados ou não, letrados ou não, alinhados ou não. Construamos um Estado, de fato, democrático, avesso a privilégios injustificados e intolerante com toda espécie de larápio, ainda que sob a forma de um cafetão.

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