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domingo, 16 de novembro de 2014

BUMERANGUE


BUMERANGUE
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br




                Como um bumerangue mal arremessado que, ao retornar em direção a quem o lançou, atinge a jugular e ceifa a vida, assim tem sido comigo, contigo e com cada um de nós. A mesma sociedade que, diuturnamente, se queixa de ser “vítima” da violência – hoje não mais apenas urbana –, das mazelas nascidas da corrupção, da governança incompetente, quando não criminosa e irresponsável, do tráfico que a olhos vistos compromete o futuro de gerações inteiras e faz do viciado um completo imbecil, aniquilado do ponto de vista ético, moral, cognitivo e produtivo, esta mesma sociedade não passa, na verdade, de algoz dela mesma. As mesmas classes média e alta que tecem discursos inflamados contra a guerra do tráfico são as maiores consumidoras de maconha, ecstasy e cocaína, por exemplo. Muito comum é vermos o “filhinho de papai” – não raras vezes, o mesmo que ainda há pouco desrespeitava as regras da escola e mandava os pais tomarem no ... – infestar, em meio à roda de zumbis mentecaptos, o ambiente de praças e residências com o fétido cheiro da morte exalado pelo baseado. Ora, o que são as “aventuras” de tais adolescentes senão a face da mesma moeda que alimenta o crime organizado, as facções dentro dos presídios e o poder “paralelo” instalado, tal qual taenia, nas entranhas do Estado? Por que escandalizar-se com as cracolândias e não com as festas raves regadas a muito álcool, sexo e drogas? Por que escandalizar-se com a violência corporificada no vocabulário chulo ou no porte de arma do adolescente que guarda a boca de fumo e não com o uso irresponsável das redes sociais para ofender, difamar ou ameaçar? Por que escandalizar-se com as milhares de vítimas do trânsito e não com a direção perigosa, em alta velocidade e embaçada pelo torpor do álcool e dos entorpecentes? Quanta hipocrisia. Julgamos apenas pelo “fim” e não pelos “meios”, pela “aparência” e não pela “essência”. Assim, se a embriaguez não é descoberta e nem tampouco gera acidentes, está tudo bem. Caso o filho ou a filha, pouco mais do que uma criança, seja promíscuo, tudo certo, desde que se cerque de cuidados para evitar uma gravidez indesejada. Engravidando, contudo, é “só” abortar, desde que sob o manto da discrição e do anonimato. Observar que a prole chega em casa com objetos alheios ou com olhos a denunciarem o uso de drogas, tudo bem, mas que não venha ninguém reclamar. A sociedade que temos é a que merecemos. Colhemos, quase sempre, o que semeamos. Fazer da urna latrina e desejar que saia dela bons gestores ou representantes, é um engodo. Tratar o corpo como um receptáculo do consumismo doentio e querer uma longa vida com saúde física e mental é, no mínimo, uma grande ingenuidade. Imaginar um ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável sem abrir mão dos penduricalhos nascidos do Capitalismo, por sua vez, não passa de um enorme paradoxo. O “destino” parece algo inexorável. Assim como um bumerangue, a vida, muitas vezes, tem um caráter retributivo, refletindo nossas escolhas. A sociedade, em última instância, é nossa própria imagem e semelhança. 

domingo, 9 de novembro de 2014

CONVITE À PERMISSIVIDADE


CONVITE À PERMISSIVIDADE
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                O Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (CEED), através de uma de suas Comissões, acenou com a possibilidade de emitir um documento, em princípio sob a forma de Parecer, que traz, dentre outras coisas, a vedação às instituições de ensino, públicas e privadas, de suspenderem ou transferirem compulsoriamente alunos com problemas disciplinares. A malfadada iniciativa do Conselho conseguiu algumas proezas. A primeira delas foi a de colocar do mesmo lado da mesa os sindicatos patronal (SINEPE/RS) e de professores (SINPRO/RS), o que para muitos parecia impossível. Além disso, a minuta engendrada nas entranhas do referido Colegiado suscitou a indignação, para não dizer a ira, de quase todos os segmentos que compõem o próprio Conselho, reação esta que lançou dúvidas sobre a própria legitimidade da iniciativa do CEED. Verdadeiro tiro no pé. A Audiência Pública ocorrida na Assembleia Legislativa corroborou o que já se sabia. A maioria acredita que retirar da escola o direito de suspender ou transferir compulsoriamente o aluno indisciplinado, em casos comprovadamente necessários e justificáveis, fere não apenas a autonomia constitucional das instituições de ensino (privadas), mas reforça o pérfido hedonismo que há muito vem sangrando a ética e os mais elementares princípios de convivência social. Apesar das eventuais boas intenções (dizem que o inferno está cheio delas...) por detrás da iniciativa personificada na minuta em questão, urge posicionar-se contrário à “fórmula mágica” encontrada por alguns conselheiros frente à necessidade de se garantir o direito a todos os educandos – mesmo aqueles que demonstram não quererem – de assento nos bancos escolares. Esquecem eles, contudo, que as escolas, em princípio, são as primeiras a desejarem, por exemplo, não apenas a permanência, mas, sobretudo, o sucesso do educando. Não por acaso, todo o empenho dos professores e diversos Setores que compõem a escola no intuito de contribuírem para o crescimento cognitivo e humano do aluno. Além do mais, transferência para outras instituições de ensino, no caso das escolas privadas, representa, dentre outros prejuízos, uma diminuição no fluxo de caixa. Portanto, não é uma medida nem simpática, nem tampouco bem-vinda. Todavia, em casos pontuais – vale lembrar, que as transferências compulsórias representam um ínfimo percentual no universo de alunos – é, sem dúvida, uma “saída” (literal) necessária. As medidas extremas, e a transferência compulsória é uma delas, vêm sendo aplicadas naqueles casos onde a indisciplina do aluno é reiterada, onde se observam práticas e posturas inadmissíveis e de elevada gravidade, onde a omissão, condescendência e permissividade da família põem a perder todo esforço da escola no sentido de “resgatar” o aluno indisciplinado e onde a permanência do educando significa uma ameaça ao sagrado direito da maioria a um ambiente ordeiro, sadio e pedagogicamente adequado, por exemplo.  A escola, por vezes, comete abusos? É provável que sim. Aí entra, numa última instância, o Judiciário para reparar eventuais danos causados ao aluno e sua família. A contrariedade, quase unânime (neste caso, não é sinônimo de burrice...), à minuta do CEED não deixa dúvidas quanto à pretensão da maioria em não tergiversar ante a escalada do relativismo doentio que olvida os mais nobres e necessários valores historicamente construídos, valores estes indispensáveis à construção de uma sociedade melhor e mais fraterna. 

Veja também:
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