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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

IMIGRANTE



IMIGRANTE
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Certa feita, ouvi de um Padre – durante a homilia – uma expressão, no mínimo, interessante. Para lá do eventual romantismo ou do aspecto histórico, o termo encerra outros sentidos. Início de mais um ano letivo e, com ele, aquela conhecida cena: o aluno novo que chega na escola. É como se caísse de paraquedas em local desconhecido e, por vezes, aparentemente hostil. Tudo parece, num primeiro momento, conspirar contra ele. É como se todos nele reparassem ou, talvez o que seja pior, o ignorassem por completo. Desconhece os caminhos, a disposição das salas e até mesmo o rumo do banheiro. Verdadeiro estranho no ninho. Estrangeiro! Imigrante! Feito gado no corredor, sente-se oprimido. Teme em perguntar, pois não quer chamar atenção, vai que o tomem por exibido. Por outro lado, urge falar, pois que náufrago em meio a um oceano de dúvidas e questionamentos. Triste sina aquela. Sente-se abandonado, lançado aos leões. Mais do que nunca, ressente-se da ausência dos amigos, dos colegas de outrora. Na outra escola era rei. Agora, um desconhecido. O anonimato só é menor do que a angústia a lhe oprimir o peito. O despontar de um novo ano letivo traz consigo, entre outras, a necessidade de exercitar a solidariedade, o coleguismo, a acolhida. O início das aulas gera levas e mais levas de imigrantes, fazendo surgir, mais do que nunca, a premente carência de corações dispostos a estenderem a mão. Pessoas com a firme intenção de ciceronearem os estrangeiros, de apadrinharem os que vêm de outros páreos. Caminhar pela escola, indicar os prédios e banheiros, dar as boas-vindas... Iniciativas simples que fazem a diferença e criam vínculos. Singelas ações que, ao contrário de parecerem piegas, calam na memória e na alma. A “xenofobia” cede lugar à empatia. A indiferença dá lugar à amizade, mesmo que ainda tênue. É assim que nascem as melhores relações. É assim que se revelam os que, de fato, são capazes de transformarem positivamente o mundo. Sejam bem-vindos todos, imigrantes ou não! Bom 2013. 

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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

COMEÇAR DE NOVO



COMEÇAR DE NOVO...
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


Começar de novo e contar comigo
Vai valer a pena ter amanhecido
Ter me rebelado, ter me debatido
Ter me machucado, ter sobrevivido
Ter virado a mesa, ter me conhecido
Ter virado o barco, ter me socorrido.
(Ivan Lins)



                Mais um ano letivo! Momento de rever colegas e professores. A vontade, mesmo que disfarçada, de mostrar a mochila nova, os cadernos de capa dura, o tênis da hora, o bronzeado nem sempre adquirido na praia, o corpo sarado... Não mais do que dois meses de férias. Tempo suficiente para escancarar o “tiro” na estatura de muitos. Ainda ontem, um piá, franzino e pequeno. Hoje, um baita guri. Duvidar, ultrapassou quem o gerou. Misto de empolgação e suspense, perpassado pelo “friozinho” na barriga. Como estou? Como estão os outros? Qual será minha turma e quem serão meus colegas? Necessidade, natural, de aceitação e pertencimento. Sentimento tão antigo quanto o de fixar as listas de chamada em alguns pontos estratégicos da escola. O agito do primeiro dia de aula contrasta com o olhar perdido do aluno novo. Para este, tudo é novidade: a palavra do Diretor, a bênção do Padre, os avisos da Disciplina... Alguns mal conseguem esperar o ingresso na sala. Quem será o Regente? Onde sentarei? Quem serão os professores? Vão-se os anos, os sentimentos teimam em serem os mesmos. Prova inconteste de que temos em comum com os outros – mesmo que separados por gerações – muito mais do que, às vezes, imaginamos. Afinal, somos humanos. Descendemos da mesma cepa. Precisamos, portanto, uns dos outros. É o “outro” que nos completa, nos constitui, nos dá forma. Sem “ele”, não existimos. Sequer somos ilha, pois que esta só existe se rodeada pelo oceano. Ah, que beleza é a escola! Quanta vida! O burburinho, o ti-ti-ti, a algazarra no pátio atestam o viço que corre em todas aquelas veias e artérias. O coração se enche não apenas de sangue, mas de alegria e de esperança. Querelas do passado e animosidades pretéritas se dissipam. É tempo de perdão, de amor... É tempo de apostar no irmão, pois assim o fazendo se aposta em si mesmo. No pátio da escola, o que conta é o currículo dito oculto, tangenciado pela amizade e pela cumplicidade sadia. Bem-vindo todos os convidados, pais, alunos e funcionários. São vocês, somos nós, que atribuímos sentido à escola. Bom ano letivo a todos!

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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013



O MAR E A PISCINA
Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Estive na praia de Ingleses, em Florianópolis, há alguns dias. Fiquei – juntamente com minha família e alguns amigos – oito dias. Tempo suficiente para perceber a diferença entre dois mundos: o do mar e o da piscina. Enquanto o primeiro como que socializa os abismos sociais e econômicos, o último os escancara. À beira do mar, pouco ou nada se sabe acerca da origem – salvo alguns claros sinais da presença castelhana na orla –, profissão, classe social, renda, preferência sexual, conta bancária, etc., dos que se escondem sob os guarda-sóis ou sob os chapéus de largas abas. O vai e vem das ondas é feito o movimento do apagador do mestre. Quando muito restam alguns pequenos e quase sempre indecifráveis vestígios do que antes existia. O mar mostra toda sua imensa sabedoria ao aproximar homens e mulheres, pequenos e grandes, ricos e pobres, negros e brancos, crentes e agnósticos, letrados e analfabetos, nativos e estrangeiros... A piscina, ao contrário, privatiza o lazer, tornando-o por um lado asceta, por outro, sem graça. Aproxima apenas alguns poucos, os da própria tribo, porém recrudesce o fosso entre uma minoria e o “resto”, a maioria. O mar tem cheiro de povo. A piscina, de cloro. O sal do mar é terapêutico, cicatrizante, na quantidade exata da necessidade de cada um. A piscina tem, quando muito, ao seu redor, o sal que tempera a carne do churrasco e aumenta a pressão arterial. Sem ciúme ou disputa de beleza, o mar convive com a presença das montanhas, do verde, das dunas, dos braços de rios... Jurerê, Costão do Santinho, Armação, Praia Brava, Daniela, Joaquina... Tantos nomes para uma só maravilha! Sem qualquer espécie de maquilagem. Sem os penduricalhos nascidos de laboratórios e indústrias de cosméticos. Simples, natural e belo. Assim é o mar. Este, apesar de sua imensidão, acolhe a todos e a cada um. Nada pede em troca. Nem tostão, nem troca de favores, nem mesmo um elogio. Sua grandeza é tamanha que ao nele adentrar, os corpos se desnudam, como que a reverenciá-lo. O mar a todos nivela. Aos mais desavisados e descuidados, por vezes, traga. A piscina carece de vida. É estéril. O mar, ao contrário, confunde-se com a própria gênese de todos os seres. Perfeita simbiose. Daí seu encanto. Daniela e suas águas tranquilas ou a Praia Brava com todas aquelas ondas a chicotearem, com força, as rochas. Inúmeras e belas faces de uma mesma moeda. A piscina, apesar de toda languidez, peca pela falta de desafio. O mar, ao contrário – talvez embalado pelo canto de suas sereias –, é instigante. Mexe com os brios do exímio nadador e atrai o olhar dos que ainda se apaixonam. Saudade do mar e dos amigos...