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sexta-feira, 23 de novembro de 2012

ACOLHIDA: O DESAFIO DA POLÍTICA DE INCLUSÃO



ACOLHIDA: O DESAFIO DA POLÍTICA DE INCLUSÃO
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                A famigerada, para alguns malfadada, política de inclusão parece algo já dado. Aparentemente, não se discute. É lei e pronto! Não por acaso, muitas são as instituições de ensino (principalmente, privadas...) que buscam, de alguma, forma – e mediante inúmeras justificativas questionáveis –, burlar o ordenamento jurídico, como forma de resistir à matrícula de pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. A dita inclusão, sob a ótica de um grande número de educadores, é um pesado, quase insuportável, fardo. Bonita sob o ponto de vista teórico, mas impraticável no dia a dia. Inúmeros são os sindicatos de professores, país a fora, que vêm se mobilizando de forma contrária à referida política governamental. Argumentos não faltam para alimentar a crítica: despreparo dos professores, ausência da família, precariedade física das escolas, escassez de recursos, número excessivo de alunos por turma, descaso com a formação dos educadores, e por aí vai.
                No Brasil, infelizmente, a regra tem sido a tomada de decisões, por parte dos entes públicos, a partir desta ou daquela visão político-partidária. O que deveria ser “política de Estado”, no fundo não passa de “política de governo”, portanto eivada dos vícios típicos dos mais variados matizes ideológicos. Assim, o que deveria ser duradouro e sério, já nasce condenado à crítica de amplos setores da sociedade, quase sempre alijados do processo de discussão e de decisão. Ideias e iniciativas governamentais surgem e desaparecem de forma meteórica. Não fosse o, quase sempre, elevado custo e ignóbil desperdício de dinheiro público, passariam despercebidas. São, muitas vezes, iniciativas que atendem, sobretudo, ao ego e interesses particulares, em prejuízo da coletividade. Cria-se um indisfarçável clima de desconfiança frente a toda e qualquer iniciativa do Executivo ou Legislativo, mesmo que a intenção seja louvável.
                O grande desafio da “política de inclusão” é fazer desta uma “política do acolhimento”. Apesar de alguma similitude, a segunda se mostra mais humana do que a primeira. Esta soa como inserção à força, imposição, do tipo “enfiar goela abaixo”... A “política do acolhimento”, por sua vez, pressupõe convencimento, especialmente de quem acolhe. Ora, se quem acolhe (professor, colegas, a escola como um todo...) estiver convencido acerca da escolha feita, trilhar-se-á meio caminho. Afinal, acolher é desarmar-se. É mostrar-se solícito, pronto para o diálogo, aberto para eventuais mudanças exigidas pelas novas (e antigas!) demandas. Acolher é desacomodar-se, é “largar o queijo” em prol do “outro”. A “política do acolhimento” pressupõe humildade e sinceridade, pois que sem tais valores, toda e qualquer relação, por melhor que seja, está fadada ao fracasso. Acolhimento lembra alteridade, preocupação com o “outro”, comprometimento... Na “política do acolhimento”, o formalismo frio advindo da preocupação (às vezes, falsa) com a lei, dá lugar à brasa ardente da paixão. É fogo que alimenta a resiliência, aquece a alma e aproxima as pessoas, apesar (e principalmente por causa delas) das diferenças. Estas, sob a ótica da “política do acolhimento”, são, não um estorvo a ser afastado, mas matéria-prima para um conviver sadio e fraterno. 

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

LAMBENDO SABÃO



LAMBENDO SABÃO
Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Dia desses, flagrei uma amiga usando a expressão “lamber sabão”. Desacostumado a esta, inquiri o significado. Disse que a usara como sinônimo de liberdade de opinião: “cada um tem a sua!”. Intrigado, apelei para a internet e logo encontrei uma significativa quantidade de explicações para a referida expressão. Muito antiga, ela normalmente vem sendo usada como reprimenda a algum incauto de “boca-suja”, familiarizado ao uso de palavras de baixo calão.

                A alegada “pós-modernidade”, por estas bandas, tem engendrado uma interminável quantidade de mudanças na forma de vestir, de andar, de cultuar, de se portar, de falar... Mudanças quantitativas e qualitativas. Superficiais e profundas. Específicas e genéricas. Muitas mudanças. Não é incomum, jovens usarem de expressões verbais chulas e, segundo os mais “velhos”, ofensivas e desrespeitosas. O que noutros tempos era agressivo, hoje por vezes é sinônimo de amizade e cumplicidade. O mesmo “foda-se” que ofende é, noutro contexto, sinal de pertencimento à tribo. Vá entender! Tudo depende de quem fala, para quem fala e por que fala! Depende, também, vez por outra, de quando e onde fala. Noutras palavras, o problema, aparentemente, não está na palavra em si, mas na relação que se estabelece entre os sujeitos que falam. Será?

                O velho Juca já dizia – parafraseando as Santas Escrituras – que a boca diz aquilo que está cheio o coração. Assim, palavras duras denunciam um coração rancoroso, enquanto palavras dóceis refletem um coração cheio de amor. É o que dizia meu avô. Exageros à parte, é inegável que as gerações mais novas – em grande parte – parecem desconhecer mais do que uma ou duas dezenas de expressões. Além de excessivamente limitado, o vocabulário se mostra absurdamente tosco. Coisa de causar espanto até no mais distante neandertal. O “uga-uga” deu lugar ao “pô meu!”. Acrescenta-se ao vocabulário um “caralho”, um “merda”, um “porra” e um “saca só”, e pronto! Temos um glossário quase completo do linguajar ultramoderno. É de doer. Pior então, é quando a gurizada inventa de escrever. Aí as “expressões” acima ficam mais “simples” ainda. Viram um “kct”, um “mrda”, um “pqp” e por aí vai. Mal ou bem (quase sempre, muito bem...), os jovens se entendem. Nós, os mais velhos, é que não os entendemos.

                Falso moralismo de lado, preocupa a lastimável miséria do vocabulário hodierno de nossa juventude. Pobreza não apenas de letras, mas de sentimentos. A palavra é como o invólucro destes últimos. Grandes sentimentos não cabem em expressões de tamanha irrelevância. Joias preciosas (e os sentimentos o são) devem ser guardadas em locais apropriados, da mesma forma que vinhos bons devem ocupar odres novos. A carestia, hoje, é tanto dos bons vinhos e preciosas joias, quanto dos odres novos e porta-joias adequados. Carece-se também de sentimentos nobres e palavras boas. Mais do que nunca, urge que muitos lambam sabão. Haja sabão, é verdade! Mais difícil, contudo, é achar pessoas dispostas a mandar seus filhos, amigos e alunos lamberem sabão. Complexo e desafiador exercício de autoridade. É nadar contra a maré, pois que politicamente incorreto. Não é fácil dar a cara ao tapa, ainda mais quando tanto a cara quanto o tapa se propagam na velocidade da luz por meio das redes sociais. Apesar do risco, alguém precisa dizer aos jovens (e não jovens...): vão lamber sabão!   


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

PUNTA E A PONTE



PUNTA E A PONTE
Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                Feriado à vista, hora de viajar... Para alguns, é claro. Uma minoria, como minha amiga que irá para Punta. Eu, ao contrário, não transporei a Ponte. Punta e Ponte. Apesar da proximidade gráfica e fonética, realidades díspares. A primeira, o paraíso dos turistas. A última, o inferno de Dante. Enquanto para aquelas bandas do Uruguai reina, ao lado do sol, o dólar, uma boa Norteña e um bocado de corpos esculturais, por aqui o que sobra é indignação, aumento das passagens e uma avenida permanentemente engarrafada a cortar a cidade. Lá por Punta, sorrisos e a gorjeta correndo solta por entre as mãos dos garçons. Por aqui, o endividamento do Município e a demonização dos servidores (a estes, nem as gorjetas...), como se fossem o vilão da história. Lá em Punta, cassinos por toda parte, enchendo os bolsos dos empresários e os cofres públicos. Por aqui, sobra moralismo, enquanto escasseiam recursos e prolifera a marginalidade. Por lá, comércio abarrotado de gente, saindo pelo “ladrão”. Por aqui, meia dúzia de lojas ameaçadas, também (vejam só!), pelo ladrão. Trocadilhos à parte, a realidade na terra da Ponte é de chorar. Lá em Punta é de rir. Por lá, praias paradisíacas. Por aqui, nem praia, nem paraíso, nem sequer sombra ou água fresca. Esta última, além de quente, é cara. Muito cara. Como o é a luz, o combustível, o transporte (de novo!), o pão, o leite... Por aqui, na Ponte, paga-se caro, come-se mal e vive-se pior ainda. Só não se mora, ainda, embaixo da Ponte porque não dá. Faltaria lugar. Quem vai à Punta tem o Puerto, Casapueblo, Playa Mansa, Museo del Mar... Quem fica tem... tem... tem o quê mesmo? Ah, tem o Parcão e o Shopping do Vale (caso não tenha fechado). Tá bom, cinco dias no ano tem, ainda, a Casa do Leite! Punta e a Ponte. O que é a distância física comparada à distância de qualidade de vida, infraestrutura, lazer, segurança, hotelaria, paisagística? O que são pouco mais de setecentos quilômetros comparado à estratosférica diferença entre o que se tem por lá e o que se tem por aqui? Por lá, o Rio da Prata, por aqui o Gravataí. Querem mais? É, o balneário no departamento de Maldonado parece coisa de outro planeta. Os “descendentes” de Don Francisco Aguilar, eles são os “ETs”. Os de cá, os da Ponte, somos – ao contrário – o centro do universo. Ironias à parte, ao que parece os “herdeiros” do Coronel João Baptista Soares da Silveira e Souza Sobrinho ficaram com a lentilha, enquanto os de lá, os de Punta ficaram com tudo o mais. Eles, Jacó. Nós, Esaú. Eles, Punta. Nós, bom... só nos resta a Ponte. Boa viagem minha amiga!



terça-feira, 13 de novembro de 2012

JUVENTUDE EM AÇÃO



JUVENTUDE EM AÇÃO
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br



                Esperança. Não está morto quem peleia, tchê! A Juventude em Ação está mais viva do que nunca, fazendo (re)nascer uma fagulha de esperança. Como professor, vejo com profunda preocupação a flagrante apatia dos jovens no que tange à efetiva participação nos desígnios de nosso Município. Além de parca, tem sido uma participação de tez partidária. As poucas lideranças que nascem nos movimentos acabam por lançar mão das mesmas práticas que há pouco condenavam. São facilmente cooptados, afastando-se das utopias em troca de um que outro aparente privilégio. Viram a “casaca”, e de ferrenhos opositores se tornam cabos eleitorais, não sem antes terem “mamado” nas já conhecidas tetas do poder. Sonhos são abandonados em troca de algumas moedas advindas do status de estagiário nesta ou naquela repartição pública. Agressor e vítima confraternizam, a ponto da última ver no primeiro não mais um inimigo a ser combatido, mas sim um modelo a ser seguido. A arapuca tem o seu preço. Arrefece-se a paixão pela causa e perpetuam-se as desigualdades. O sopro da necessária e salutar subversão, matéria-prima das grandes transformações, esvanece.

                Há de se elogiar, portanto, a Juventude em Ação. Talvez, um que outro “mas”. Vocabulário às vezes chulo, ofensas pessoais, algumas estratégias quiçá equivocadas... Nada, contudo, que apague o brilho e importância da iniciativa. Há muito que não se via por estas bandas um movimento tão genuíno e original. Jovens fazendo da rua o grande laboratório da práxis libertária e dando real sentido a termos até então engessados pelo discurso acadêmico e morno (para não dizer, “morto”) das instituições de ensino. Cidadania, democracia, inclusão, igualdade, ética... Expressões que ganham vida. Desejo que a Juventude em Ação não se deixe prostituir pelos holofotes e pelo canto enganoso das sereias. Não se venda e nem tampouco se renda ao individualismo egoísta. Seja o “coletivo” a sua bandeira. Use de sua energia para canalizar as demandas que nascem de uma distribuição ignóbil da renda. Represente como que uma poderosa força centrípeta das mais diversas forças vivas da sociedade. A Juventude em Ação pode, num futuro nem tão distante, ser um importante – talvez o principal – movimento de articulação dos “sem vez e sem voz”. Para tanto, necessário é que ela se debruce na reflexão, na discussão, no tensionamento, no poder da palavra e, sobretudo, na ação, pois que é esta última que tem emprestado não apenas o nome ao movimento, mas tem sido o seu próprio norte.

               












FALÊNCIA DO ESTADO E REAÇÃO SOCIAL



FALÊNCIA DO ESTADO E REAÇÃO SOCIAL
Gilvan Teixeira
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                Há muito venho apontando para os inegáveis sinais da falência do Estado brasileiro. Não que noutros tempos ele tenha sido “saudável”, confiável, seguro ante os olhos de seus “acionistas” (contribuintes). A diferença está, digamos... na aparência. Outrora, o Estado parecia forte, inspirava alguma confiança, nem que por parte dos mais ricos ou dos mais alienados. Hoje, contudo, o Estado sequer tem conseguido salvar as aparências. Lembro que há duas ou três décadas atrás algumas vozes se levantaram em favor da dita “pena de morte”. Por quê? Não por acaso, o título deste singelo texto traz primeiro a “falência do Estado” e, na sequência, portanto somente depois, a “reação social”. Ora, a defesa de medidas extremas só ganha força quando da existência de um contexto que as justifique, pois que do contrário, as teses mais radicais acabam por cair por terra.

                O Estado brasileiro, em todas suas formas (Executivo, Legislativo e Judiciário) e esferas (federal, estadual e municipal) se vê envolto em sérios problemas: falta de credibilidade, morosidade, ineficiência, corrupção, abuso de poder, ingerência indevida, alto custo, entre tantos outros. Criou-se um perigoso e pérfido “caldo cultural”, onde importantes valores – como a honestidade, o trabalho, a ética, a verdade, o sentimento de justiça, etc. – há muito vêm sendo preteridos em favor da malandragem, do “jeitinho”, do lucro fácil, do hedonismo exacerbado e do relativismo irresponsável, por exemplo. Um “caldo” que alimenta corruptos e corruptores, viciados e traficantes, aliciados e aliciadores. Um “caldo” que funciona como pá de cal às virtudes, fazendo destas últimas uma exceção, quando deveriam ser a regra. Ao criminoso os benesses de uma legislação ultrapassada, onde viceja a injustiça. Perdem quase todos, enquanto poucos ganham. Perde a sociedade como um todo, ganha o criminoso. Sai no prejuízo o contribuinte, enquanto a indústria do “recurso protelatório” enriquece alguns escritórios advocatícios. O medo impera nas ruas, muitas destas tomadas por viciados, bêbados irresponsáveis, gangues, pichadores, quadrilhas, assassinos, larápios de toda sorte. A polícia, quando prende, se vê desmoralizada pela prática corriqueira da malfadada liberdade provisória, do semiaberto, da fuga, das medidas “compensatórias”. O garantismo tem servido de eufemismo para impunidade. A mensagem que fica parece clara: no Brasil, parece valer a pena traficar, roubar, corromper e matar. Parece valer a pena apropriar-se de bem alheio, desviar recursos públicos, lançar mão de meios fraudulentos para obter sucesso em licitações e assim por diante. O risco é pequeno, e enorme é a probabilidade de se sair impune. Enquanto isso, vegeta a saúde, fracassa o ensino e preocupa a segurança. Serviço público, no Brasil, tem sido sinônimo de ineficiência e desconfiança.

                O cidadão tem o direito de se defender, defender sua família e seu patrimônio. Direito este não apenas legal, mas ético. É um direito básico, portanto anterior à própria lei. Esta, por sinal, é um fenômeno temporal, portanto histórico, ao contrário dos princípios éticos, que são atemporais. Assim, ao contrário do que apregoam alguns, a própria Constituição não pode ser colocada acima da ética. Ora, a “pena de morte”, em que pese ser questionável sua aplicação, revela como que o “basta” dado pelo grupo social aos que ofendem grave e irremediavelmente os princípios mais caros da ética. No Brasil, tal pena está fora de cogitação, pois que não encontra guarida no ordenamento jurídico. Ainda que tivesse previsão legal, sua aplicabilidade seria temerária, dada a incapacidade do Estado brasileiro em inspirar confiança em suas ações. O que fazer então? Ao que parece, são poucas as alternativas. Talvez a longuíssimo prazo, tipo... a perder de vista, aumente o número delas. Todavia, as questões postas em jogo não podem mais esperar, especialmente a segurança. Esta requer medidas imediatas, urgentes. Ou somos nós, ou é o criminoso. Ou é nossa família, ou é o bandido. Este, por certo, não guardará o tempo necessário para que as hipotéticas ações do Poder Público venham a dar resultado. O criminoso tirará a nossa vida e de nossos entes queridos sem dó e nem piedade. Sem pestanejar – muito provavelmente, embalado pelos efeitos das drogas –, ele roubará, matará, estuprará, sequestrará, abusará sem pensar duas vezes. A segurança e a vida de nossas crianças, jovens, esposas e companheiras, idosos, depende de nós. Aguardar pelo Estado é assinar o atestado de óbito de quem queremos bem. A sociedade precisa reagir com rigor, de forma extrema, até que o Estado se mostre capaz de dar conta daquilo que é de sua obrigação. Portanto, mais do que nunca é necessário que se denuncie. A sociedade precisa “atormentar” aqueles que hoje a atormentam. Associações de moradores devem se mobilizar, achar formas e disponibilizar recursos para garantir a segurança. A casa arrombada de um, deve ser encarado como problema de todos. O assassinato de um pai de família inocente e trabalhador ou a brutalidade contra o jovem de boa índole devem ser problema de todos. Cabe a estes, portanto, a tomada de providências. Fazer o que o Poder Público há muito tem deixado de fazer (se é que o fez algum dia...). Justiça com as próprias mãos? Talvez. Barbárie não maior do que a que hoje se tem. Alguma dúvida de que vivemos a lei da selva? Pior do que isso. Além de bárbara, muito cara. Paga-se incontáveis quantias para, estarrecidos, ver os corpos de quem amamos apertados em ataúdes. Corpos desfigurados pela violência. Paga-se caro pelos discursos politicamente corretos, porém estéreis, sem qualquer efeito prático. Paga-se caro pelo legalismo que alimenta um Judiciário corporativista, insensível, embasbacado em meio a oratórias recheadas de uma língua morta. Paga-se caro pela morosidade dos processos, pelas demandas não julgadas em tempo oportuno. Paga-se caro por uma burocracia insana que zomba do trabalhador pobre. Onde está o Direito? Onde está o Estado de Direito? Direito de quem e para quem? O Estado não é confiável. Tem sido um fim em si mesmo. Existe para garantir conchavos políticos e estabilidade para uma infinidade de gente. Um custo imensurável, com efeitos catastróficos para o presente e futuro do país. Aprendi que quem paga mal, paga duas vezes. Historicamente, tem-se pago mal neste país. Paga-se, portanto, duas vezes. A classe média (existe?), por exemplo, paga previdência pública e privada, segurança pública e privada, saúde pública e privada... A pública, em regra, esquece! A privada, em regra, a cada dia se torna mais precária. Resta, portanto, ao cidadão um último fio de esperança, a reação desesperada de quem luta pela coisa mais elementar do ser humano: a vida. Esta se encontra em perigo. Agoniza em leito de morte. Diante da falência do Estado, a reação social!

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

ENIGMA



ENIGMA
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


Eis que a primavera corria solta em direção ao caloroso abraço do verão. Mal começara novembro e a sensação era de final de ano. Natal, Réveillon, férias, praia... Por mais que resistisse, bem sabia que antes do apagar das luzes de dois mil e doze, algumas pendências precisavam ser resolvidas. Passar de ano era uma delas.

Sentia-se pressionado. Química, Física, Matemática, Geografia... Provas e mais provas. Teria de enfrentar, ainda, ENEM, simulados, vestibular aqui e acolá. Família, tios, primos, amigos e até o cachorro, todos pareciam cobrá-lo. Tão cruel quanto à cobrança explícita, era aquela outra, a que se dava nas entrelinhas. Indiretas, olhares de canto, gestos suspeitos, sorrisos estreitos. Deboche ou exagero? A mais pura verdade ou peraltices de uma mente com mania de perseguição? O fato é que sofria. Sim, padecia por ele e pelos outros. Tinha clareza do quanto era sofrível para os pais pagarem a mensalidade. Quase um carro por ano! Mesmo que usado, era um valor e tanto. Pesava no orçamento e na consciência. Não pensassem fosse ele um insensível alienado. Doía-lhe lembrar que o carnê da escola descansava com tantos outros no fundo da gaveta, engrossando dívidas e endossando uma crise conjugal que parecia não ter fim.  

Tudo a sua volta parecia conspirar. O sono, há algum tempo não o visitava e quando o fazia, era inoportuno. As noites eram regadas a Coca-Cola e Trakinas. O latido dos cães ao longe misturava-se ao tec-tec do teclado. Verdadeiro zumbi. Uma multidão deles. Velhos, jovens, crianças... Homens, mulheres... Sarados, doentes... Comunicava-se com muitos, tudo ao mesmo tempo. Era um “comunicar” inteligível, apesar de imperfeito. Junto com a madrugada, avançavam também os ponteiros do velho relógio, herança da avó, pendurado ao fundo do corredor. Duas horas da manhã e nada de conseguir dormir. Logo viria o arrependimento, feito algoz, a cobrar cada minuto de sono perdido.

Um, dois períodos... Era o tempo que levava para, finalmente, se dar conta que a aula começara. Depois de recebida a falta por não ter respondido a chamada e após meia dúzia de reclamações do professor, aí sim o galo parecia cantar. Zoavam dele.  Sua distração era motivo de chacota. Engraçado para os colegas, irritante para os professores. Era tido por desleixado, preguiçoso, “largado”... O caderno por si já denunciava a quanto ia a vida do sujeito. Alguns rabiscos e nada mais. Temas incompletos, textos pela metade, provas não assinadas... Tinha de tudo naquela bagunça. Outro dia, uma professora jurara de pés juntos que vira uma traça a corroer, faceira, a capa do caderno do aluno. Ia de mal a pior.

Dias intermináveis os que, de um tempo para cá, vivia. Ganhara peso, assim como uma permanente tristeza. O olhar já há algum tempo não apresentava aquele brilho de outrora. A mãe já observara! Falara dos olhos caídos do guri (ora, já era quase um homem...). Drogas? Não. Paixão? Muito menos. A simples hipótese de uma depressão, mesmo que leve,  já mobilizara toda a família. Psicólogo, terapia familiar, até terreiro de umbanda. Nada dele recobrar o antigo sorriso e a tez do passado. Fora os gastos, nada mais. Sentia-se um verme, um nada!  

Enquanto isso, o tempo seguia sem dar trégua. As fatídicas datas das provas e entrega de trabalhos iam chegando, feito turbilhão. Com a proximidade do término do ano letivo, ia diminuindo a margem do jeitinho e da enganação. As manobras de antes já não encontravam eco. A hora da verdade chegava a passos largos. Com ela, o medo da reprovação. A reprimenda dos pais, as inevitáveis sanções, a crítica dos avós, a troca de escola, a distância dos amigos... O mundo parecia ter sido injusto e cruel com ele. A primavera, indiferente, seguia seu curso em direção à próxima estação!

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

OS MODELOS DE PRODUÇÃO INDUSTRIAL



OS MODELOS DE PRODUÇÃO INDUSTRIAL
Prof. Gilvan
blog: profgilvanteixeira.blogspot.com.br


                A indústria, ao longo da história, passou por três grandes fases. A primeira delas foi a do “Artesanato” (até o século XV). Esteve marcada, entre outras características, pela inexistência da divisão de trabalho, pois o trabalhador (artesão) era responsável por todas as etapas da produção. Outra característica importante de tal fase era a inexistência de máquinas, sendo que o artesão contava tão-somente com ferramentas. A produção era bastante limitada, exigindo uma pequena quantidade de matéria-prima, com pouco impacto ambiental. A segunda fase da indústria foi a da “Manufatura” (entre os séculos XV e XVIII), fase esta marcada pelo início da divisão do trabalho. Apesar de ainda não ser rígida, já se percebia uma certa distribuição de tarefas. É a fase onde surgem algumas máquinas rudimentares, servindo as mesmas de força “complementar” ao trabalho humano. Há o aumento da produção e uma maior exigência de matéria-prima, sem contudo representar um impacto significativo ao meio ambiente. A terceira e última fase é chamada de “Indústria Moderna” (a partir de meados do século XVIII). Tal fase pode ser subdividida, por sua vez, em três: Primeira (1750 – 1860), Segunda (1860 – 1970) e Terceira (1970 - ...) Revoluções Industriais. A última fase da indústria é marcada pela intensa divisão do trabalho, pelo extraordinário aumento da produção (com enorme impacto ambiental) e pela importância da máquina (passa a ser o “centro” do processo produtivo).

                Durante a fase da Indústria Moderna, merecem destaque alguns “modelos de produção industrial”. O taylorismo, por exemplo, marcou o início do século XX. Caracterizou-se por ser essencialmente teórico, influenciando outro modelo, qual seja, o chamado fordismo. O taylorismo-fordismo trazia entre suas características: a especialização, o monitoramento do tempo gasto na produção, a premiação (a ideia era produzir mais no menor tempo possível), e a supremacia dos métodos científicos (já comprovadamente funcional, viável e lucrativo) em relação aos empíricos. Henry Ford buscou colocar em prática a teoria de Taylor. Adotou a chamada “linha de montagem”, focando na produção em massa, produção esta pautada na padronização e simplificação. Outra característica do fordismo era a chamada “verticalização” da produção, onde a empresa buscava depender o mínimo possível de “terceiros” durante o processo produtivo. Assim, por exemplo, a indústria Ford (o auge do fordismo se deu entre 1945 e 1968), era responsável desde o plantio da seringueira (matéria-prima da borracha) até a produção do ferro necessário na linha de montagem do automóvel.

                Outro modelo de produção industrial é o chamado toyotismo. Tal modelo nasceu no Japão (década de 1970, portanto já na Terceira Revolução Industrial) e só pode ser compreendido dentro de um determinado contexto histórico. Ora, os nipônicos ainda se recuperavam das tristes consequências da Segunda Guerra (1939-1945), sendo o Japão um país com escassez de matérias-primas. Ora, o país não podia portanto se dar ao luxo de uma produção nos mesmos moldes apregoados pelo fordismo. Ao contrário, mister é que focasse numa produção que fosse “enxuta” e otimizada. Daí nasce a ideia do “just-in-time”, ou seja uma produção programada, organizada, voltada à racionalização dos estoques e matérias-primas. O toyotismo nasce numa época em que a informática e a robótica ganham força, sendo marcado ainda pela multifuncionalização do trabalhador. Ao contrário do fordismo – onde o operário se atinha a uma só função –, o toyotismo valoriza o profissional dinâmico, versátil, adaptável às necessidades do mercado. Outra característica deste modelo é a preocupação com a qualidade (já o fordismo partia da ideia de um “controle por amostragem”, portanto muito limitado), bem com a personalização do produto, prática esta em conformidade com o significativo aumento do grau de exigência do consumidor.

                Finalmente, outro modelo a ser destacado é o volvismo. Surgido no ocaso do século XX (na Suécia), tal modelo tem como principais características a busca de uma, por assim dizer, “conciliação” entre o passado e o que há de mais moderno. É um modelo assentado na preocupação com a qualidade não apenas do produto, mas de quem o produz. A criatividade e o trabalho coletivo ganham força.