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domingo, 25 de setembro de 2011

O Mato do Julho

O texto foi escrito em 2008, nascendo de algumas "impressões" acerca dos corredores de uma repartição pública. "Mato do Julho" é o nome dado a uma extensa área ainda não ocupada, em Cachoeirinha.


O MATO DO JULHO
Gilvan Teixeira


            Quem diria, Cachoeirinha tem uma selva. Nela, dizem, um é o dia do caçador, outro o da caça. Acredito que somos, todos, caça. Contudo tem caça que jura, de pés juntos, ser caçador. Pobre e ignorante ser, incapaz de reconhecer sua própria essência. Torna-se presa ainda mais fácil. Não fosse tal sentimento, quiçá as caças se unissem e tornassem a luta mais equilibrada. As caças, as temos de todas as espécies. A “traiçoeira” que, sorrateira e silenciosamente, adentra no mundo de suas iguais procurando fazer o “serviço sujo” que sequer o caçador o faria. Acredita com isso obter vantagem, talvez uma relva a mais, ou ainda uma vida mais prolongada. Assim o será, até que o queira o caçador. Temos a caça “simpática” que a todos faz rir. Contudo não passa de tão-somente uma caça risonha e, como todas a outras, fadada a mais cedo ou mais tarde ver seu corpo estendido ao chão. Pelo mato passeiam a caça “condescendente”, a “melancólica”, a “parceira” (assim chamada porque, vez por outra, parte o coração de suas irmãs...), a “politizada” que – de maneira não incomum – esquece suas convicções e bandeiras de outrora, frente à ilusão de comungar à mesa do caçador. Temos, ainda, a caça que, apesar de velha e carne dura, empertiga-se na crença de ser bela. Existe até aquela espécie que, “medrosa”, se travesti em pedra na tentativa de esquivar-se à atenção do caçador. Cedo ou tarde, o inimigo ali tropeçará e a lançará ao longe, pois que imprestável. Quieta e resignada, mas sem serventia. É bem verdade que existe a que ao se transformar o faz em forma de diamante e aí é recolhida pelo caçador, virando moeda de troca e de escambo dentro da selva. Brilhante, mas vazia, pois de tal sorte acredita ser pedra que acaba por perder a seiva que corre nas veias de quem é caça. Talvez a certeza de que pedra não é, venha com a morte (pedras não morrem), onde nenhuma caça a velará e nem chorará por ela, pois que pelas pedras o coração não se condói. Em Cachoeirinha temos uma selva, onde todos os dias são do caçador.



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